quarta-feira, janeiro 21, 2015

E SE FALASSEMOS ANTES DE LIBERDADE DA (E NA) IMPRENSA?

censuraNestes dias de deus-nos-acuda, a militância jornalística e colunista acomodada nos media, na sua arte de agilizar a fazedura do prescrito senso comum, desvelou-se – aliás, como sempre – na entrega costumeira do cultivo orgânico do consenso, embora desta feita devotamente à volta de Charlie, encorpando nele a virtuosa reputação da liberdade de expressão. Os variados alardes formigaram, as sonegações agilmente e a preceito se esquivaram e as imprecisões, em aditamento conforme, exibiram-se acuradas. Com efeito, estas somadas e concertadas parcelas gizaram, de modo ardiloso, a profanação da função social que lhes cumpre, ocasionando momentos de infidelidade mediática no uso farisaico desse exercício, uso este prestado e maquilhado por rostos supostamente respeitáveis, quando não bondosos e angelicais.

Destes, quase todos, surfaram a gigantesca onda comunicacional do “je suis”, valendo-se da prancha simbólica da liberdade de expressão, quando não aparentam sequer saber (ou coragem de aprender a) nadar nas encrespadas e exigentes águas da ética do seu ofício. Sabemos que o treino é severo, a aprendizagem extremamente dura e a vigilância inclemente e ilacrimável. Por isso, muitos, assustadoramente muitos, podem querer mas falta-lhes coragem para entrar nessas águas e seguir em frente no tirocínio.

João Almeida Santos, no seu livro MEDIA E PODER, menciona (pág. 24) os princípios fundamentais que se inscrevem nesse aprendizado e que constam no silabário europeu, pomposamente designado por Resolução do Parlamento do Conselho Europeu, sobre as formas de proceder nas tais arriscadas águas da ética.

Em jeito abreviado, quais são esses mandamentos?

(1) – A responsabilidade moral dos media; (2) – A exigência de veracidade, de rigor, de imparcialidade e de independência na informação; (3) – A presunção de inocência e recusa de pronúncia de veredictos; (4) – A distinção entre notícias e opiniões; (5) – As opiniões honestas e com retidão moral; (6) – A recusa de pressões; (7) – A recusa de tratamento da informação como mercadoria; (8) – A consciência de que os media não representam a opinião pública e de que não são poderes nem contrapoderes, porque não estão sujeitos aos controlos democráticos; (9) – A limitação do estatuto económico das empresas de comunicação e das orientações ideológicas dos editores e dos proprietários pelo direito fundamental à informação e pelos princípios éticos.

Como tenho reiterado de modo axiomático, o homem sendo um ser de relação, o juízo ético do valor da liberdade não pode, por essa raiz indeclinável, diria mesmo ontológica, tolerar a inobservância exigente dessa relação. A função social dos media a tal não escapa e, em consequência, ela encontra-se institucionalmente regulada pelos diversos códigos éticos ou deontológicos que, naturalmente, fundam a sua legitimidade. É confortável surfar a onda comunicacional do “je suis charlie”. Será bem mais bicudo, cada um no seu ofício, exibir o dito silabário lembrando aos poderes e aos seus concidadãos a sua determinação pela liberdade de imprensa, exprimindo-se corajosa, responsável e livremente.

Imagem retirada DAQUI

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