Como gostamos e nos cansamos de cavaquear sobre o viver, e é difícil concluir esse assunto, comecemos por fantasiar a vida como a imagem de um café. No início, está quente e agradável, depois esfria, amarga e no fim resta apenas a pergunta; será que precisava mesmo de tanto açúcar para o adocicar? Afinal, viver não é só respirar, comer e esperar pelo momento em que a nossa bateria se cansa e o carregador adormece...
Por vezes, não nos damos conta de que a vida é retalhada
pelo pormenor. Cada pedaço de tempo é cortado em fatias finas, muitas vezes
invisíveis, que nos escapam sem darmos por elas. Esses pequenos detalhes
parecem ser a base de tudo, mas talvez sejam apenas as nossas maiores
distrações. O valor da simplicidade apresenta-se ausente, como uma promessa
vazia que nunca chega a cumprir-se. Estamos sempre ocupados, sempre com pressa,
como se o tempo fosse um jogo de cartas que precisamos ganhar, mesmo sem
sabermos as regras.
O mar agitado de uma vida aculturada pela matemática do
tempo engendra uma existência repleta de atrativos dispersivos e
insignificantes. Vivemos bombardeados por mil e uma opções: publicidade,
compromissos, prazos e, claro, redes sociais que bem alimentam a nossa
disfunção. E é aqui que a mente, em força, se confunde, se cansa e se fadiga.
Não está treinada para absorver tanto estímulo e leveza. Não tem tempo para
parar e refletir, e por isso cede à superficialidade das distrações aceleradas.
Oscilamos entre a miséria e o valor das palavras, embaralhando as emoções, sem
tempo para as digerir. Tudo parece urgente e essência, e se apresenta como tal,
mas pouco, ou quase nada.
Viver, então, transforma-se numa dança descompassada: foge-se do "ser", entregando-se à arritmia do "ter". Quando se tenta fazer algo com real sentido, logo os hábitos e a rotina entram em cena, com as suas acomodações leves e confortáveis. A mente vicia-se nessas matrizes previsíveis, alimentadas por uma inquietação constante quanto ao futuro. O homem, atento e preocupado, não tem assim tempo para se distrair com a razão das exigências, muito menos com as grandes incertezas da vida.
Pergunta-se; mas saber viver passará mesmo, e só, pelos
embaraços das riquezas enfadonhas, dos negócios deturpados e dos vaidosos
prazeres do nosso ganancioso umbigo? Neste tempo sempre insuficiente, vivemos assim
cansados numa fuga contínua onde nunca temos tempo. E é essa urgência constante
que nos torna indiferentes ao que é diferente, encolhidos em bolhas cômodas e
diversas da insensibilidade sorumbática da apatia.
No meio dessa montanha-russa que é a vida, de vez em quando
ela lança uma piada. E a piada está justamente em perceber que, no seu fundo,
tudo isto é um grande teatro improvisado, onde os erros são os nossos maiores
aliados. Por isso, respire fundo, desperte uma piada, e lembre-se que a vida é
uma jornada alienada, cheia de reviravoltas. Só não se esqueça de levar um
lanche e, se possível, um bom café. Porque, no fim das contas, todos nós
precisamos de um pouco de café para aguentar os altos e baixos desse aparato
chamado viver.
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