Vivemos uma época deploravelmente original, ou seja, quanto mais as empresas falam de igualdade, diversidade e causas sociais, mais crescem os seus proveitos e reconcentram a sua figura no utópico fim do comum. Não, não nos deixemos embalar por cartazes coloridos e suas obscenas campanhas que, sem desonra, exaltam a presunção, a inclusão ou o reforço do poder. A doutrina, porém, preserva-se fria e imperturbável, como sempre tem animado o capitalismo, tudo metamorfoseado em produto, sem esquecer, vejam bem, as nossas sublimidades mais íntimas.
É essa a provocação feita por estudiosos que ousam estudar e
falar, quiçá no deserto, deste atual “capitalismo woke”. Todavia, longe de ser
um erro de percurso ou uma moda estranha, o fenómeno não é mais do que a
evolução consonante do próprio capitalismo, depois de décadas de adaptação aos
ventos culturais e políticos do tempo desbravado. Contudo, o que mudou não foi
o plano, mas sim as roupas que ele traja.
Durante o século XX, o trabalhador deixou de ser apenas um
mero corpo que produz, para se tornar também um sujeito que sente, se
identifica, protesta e se impõe como condição. Presenciámos, então, a empresa
incluir-se numa sociedade que não vende apenas produtos, mas que também
inscreve valores, ética e antevisões. Logo, nesse decurso, o próprio
capitalismo teve de reconfigurar-se: já não bastava explorar, tornou-se
necessário aliciar, logo, seduzir. Assim sendo, já não basta apenas vender, é
preciso impressionar e emocionar. É aí que o arrazoado woke entra em cena, não
como resistência, mas como utensílio da sua arte dramática.