Todos temos problemas, mas não é mau insistirmos em tê-los: uns inevitáveis, outros necessários, alguns até fecundos, pois forçam-nos a crescer. Mas há também contratempos insólitos, aqueles que não nos acontecem, mas que persistimos em cultivar. Curiosamente, viver parece exigir essa estranha necessidade de complicar a própria verdade. No entanto, o valor humano da simplicidade continua a ser uma lição esquecida: viver pode ser, também, aprender a clarear o que complicamos, a deixar que a vida seja menos intrincada do que a nossa mente deseja.
O nervo da psicanálise, todavia, avisa-nos de que tais
achados não são, de todo, indiferentes. Essas criações assinalam a persistência
do inconsciente em nos prender naquilo que não compreendemos de nós mesmos.
Assim, o estorvo imaginado não é mera idiotice, mas antes a encenação de uma
disputa íntima que busca juntar o hábil artifício com o encenado jogo do desejo
e do medo. Reconhecer este vício de jogar pode ser, evidentemente, o primeiro
passo para regenerar a tolice em consciência, procurando, tanto quanto
possível, dar-lhe um sentido mais enraizado.
É bom entendermos que muitos dos nossos problemas são
inventados, fruto dessa estranha e imbecil necessidade de complicar. E talvez a
grande sabedoria resida, afinal, em reaprendermos a simplicidade, não a do
simplismo ingénuo, mas a da clareza que nos devolve ao essencial.
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