quinta-feira, dezembro 25, 2025

O NATAL, O TEMPO, A MEMÓRIA E O FUTURO

O Natal sempre se me apresenta como um tempo que regressa. Mas não regressa o passado tal como foi; regressa a memória que, ao ser evocada, se transfigura. Não me lembro apenas de eventos: lembro-me daquilo que, ao ser recordado, continua a ser vivido por dentro, dando forma ao que somos.

A consciência humana não se fixa no instante. Ela prolonga-se no tempo, como um laço frágil que liga o que fomos ao que ainda podemos ser. É nessa continuidade que a memória, atravessada pela emoção e pela palavra, vai entrelaçando a nossa identidade, não como substância fixa, mas como processo vivo, sempre inacabado, sempre exposto ao sentido que se renova.

Neste tempo de Natal, sempre povoado de imagens, rituais e promessas repetidas, talvez o essencial seja prestar atenção à memória que nos habita. Não como refúgio nostálgico, mas como responsabilidade tranquila e sossegada. A memória não é, pois, um lugar de repouso, mas uma silenciosa vitalidade que nos envolve e habita o presente sem renunciar ao futuro.

Se ainda há algo a resgatar neste tempo, talvez seja a consciência de que o humano não está seguro nem definitivamente afirmado. Ele constrói-se lentamente: no modo como se lembra, no cuidado que tem com o tempo vivido e na delicada tarefa de abrir, a partir dele, um futuro que não seja apenas repetição.

Talvez o Natal, no seu sentido mais humano, seja um precioso instante de atenção ao tempo que somos, à memória que nos constitui e à possibilidade - sempre frágil - de não deixarmos o futuro tombar no fácil esquecimento.

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