Ao ler Rick Rubin, no livro O Ato Criativo: Um Modo de
Ser, encontrei um texto chamado “Regras” que me chamou a atenção. É um
texto simples na forma, mas com ideias bem provocadoras que, confesso, me deixou
intrigado e com uma curiosidade difícil de explicar. Rubin bebe muito de
práticas espirituais, e fala da arte e da criatividade de uma forma muito
ligada ao que vem de dentro, ao instinto, deixando de lado a rigidez dos
métodos tradicionais. Para ele, as descobertas criativas mais verdadeiras
acontecem quando deixamos de seguir regras fixas.
E o mais curioso são as razões que ele dá. A ideia central
tem a ver com as regras invisíveis, aquelas que nem nos damos conta de que
seguimos. São limites que não estão escritos em lado nenhum, mas que fomos
absorvendo ao longo da vida. É um pouco aquilo que Bourdieu chamava de habitus:
hábitos e formas de agir automáticas, quase inconscientes. E o problema é que
essas regras escondidas acabam por nos limitar, mesmo sem percebermos. A
criatividade perde força quando nos deixamos guiar por caminhos já definidos.
A verdade é que o nosso pensamento tem história, pois aprendemos
coisas, vivemos experiências e absorvemos cultura desde pequenos. Muitas dessas
ideias sobre o que é “certo” ou “errado” foram-nos ensinadas em casa, na
escola, ou até de forma informal. Com o tempo, esquecemos onde aprendemos
certas coisas, mas continuamos a agir com base nelas. Os valores que herdamos
da sociedade, dos media ou da moral dominante tornam-se parte de nós e isso
influencia muito mais do que imaginamos. Não são maus por si, mas o problema é
quando os seguimos sem questionar, como se fossem naturais ou obrigatórios.
As regras, em si, não são o inimigo. Elas podem ser úteis, dão estrutura, ajudam-nos a aprender e até a evoluir. Mas quando deixamos de pensar nelas, quando as seguimos só por hábito, corremos o risco de nos tornarmos reféns delas. E aí, perdemos a liberdade de criar, de pensar de forma diferente, de sermos nós próprios. É aqui, então, que entra o pensamento crítico, aquela capacidade de parar, pensar e perguntar “porque é que estou a fazer isto assim?”. Se não o fizermos, acabamos presos ao que é confortável, ao que toda a gente faz, à vulgaridade.
As regras que conhecemos e entendemos podem ser mudadas. Já as regras que seguimos sem saber, essas são as mais duvidosas. Alimentam automatismos e podem matar a originalidade. Influenciam a nossa forma de estar e de criar, sem que tenhamos consciência disso. Por isso, a liberdade criativa não vem do caos total, mas sim da consciência. Só quando percebemos o que nos está a moldar por dentro é que podemos decidir se queremos continuar a seguir essas regras ou não. Pergunto, então; será que a criatividade começa onde acabam as regras? Ou será esta uma questão meramente retórica?
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