O trumpismo não se apresenta como uma doutrina política com princípios coerentes. Trata-se de um modo de atuar, onde a comunicação se torna um engenho provocador e emocional. Em vez de argumentos racionais e fundados, a retórica é coloquial, direta e descomprometida com a verdade factual. A pós-verdade ganha espaço, e a narrativa, mais poderosa que a realidade, estabelece o tom do debate público. Nesse terreno, a verdade não é mais um princípio absoluto, é antes lamentavelmente manipulada para servir a um propósito emocional e polarizante.
Neste cenário, os inimigos simbólicos tornam-se
protagonistas da narrativa. A democracia, em seu funcionamento pluralista, é
gradualmente enfraquecida e o 25 de Abril, símbolo maior da liberdade e da
conquista democrática, é progressivamente rebaixado e descartado sem qualquer
pudor. A provocação, então, não é apenas uma tática, mas um registo político,
onde o choque é valorizado e o conflito se torna incessável. O poder, por sua
vez, não se constrói sobre instituições ou sobre processos democráticos, mas
sobre a figura do líder, que se apresenta como o libertador de um povo
supostamente oprimido pelas ditas elites.
O populismo nacionalista, tal como o trumpismo, alimenta-se da
desilusão social e do ressentimento. Ele usa o descontentamento das massas para
minar a política democrática e afastar o cidadão do debate pluralista. Ao
escavar as desigualdades e fantasiar inseguranças económicas, cria-se um clima
de instabilidade onde a representação política parece falhar, dando espaço para
um discurso simplista de "nós contra eles". O populismo explora,
assim, o mal-estar identitário, apontando como vilões aqueles que são, ou
aparentam ser, diferentes, sejam imigrantes, minorias ou as memórias
democráticas que incomodam uma visão mais reacionária do país, como o próprio
25 de Abril.
Simplificando as questões e criando uma dicotomia entre o
povo "autêntico" e as elites corruptas, o populismo encontra terreno
fértil. A polarização é sua maior aliada. O “nós contra eles” transforma-se
numa narrativa mobilizadora, onde qualquer nuance ou complexidade desaparece em
nome de uma falsa pureza nacional. Os imitadores do trumpismo sabem que, no
mundo contemporâneo, a atenção mediática é poder. E para garantir que dominam o
espaço político, nada melhor do que alimentar a polémica constante. Criam-se
disputas épicas e dramáticas, onde a verdade é substituída pela “verdade
revelada”, e a narrativa política é desenhada não para refletir a realidade,
mas para manipular emoções e dividir posições. O choque e a provocação servem
como uma forma de aprisionar a atenção e manter o conflito turbulento.
Ao minar a confiança nas instituições, desacreditando a separação de poderes e atacando a ideia de uma verdade partilhada no espaço público, o trumpismo em Portugal começa a manifestar-se de maneira sutil, mas eficaz. As conquistas democráticas, como o 25 de Abril, são progressivamente desvalorizadas. A história recente, especialmente a história da democracia portuguesa, é reescrita e distorcida para adequar-se à narrativa populista. Os discursos de ódio, exclusão e polarização são normalizados, sendo os ataques à imprensa e à justiça uma constante. A instabilidade, tanto política quanto social, serve apenas para reforçar o poder de quem se posiciona como oposição radical ao sistema.
O trumpismo, adaptado ao contexto português, não é apenas um
movimento de oposição; é um movimento de transformação das próprias bases da
democracia. Ao substituir o debate racional por uma política da emoção, e a
verdade por uma narrativa conveniente, ele ameaça perverter os fundamentos do
Estado de Direito e da convivência democrática. O 25 de Abril, como marco da
liberdade e da justiça, torna-se um símbolo que precisa ser deslegitimado para
que essa nova narrativa populista possa avançar. A batalha pela verdade, pela
verdade democrática, está, portanto, em pleno confronto e combate político e
cultural. Ao que se "chega"…
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