As nossas imagens sociais deslizam facilmente para a caricatura, numa obstinada tentativa de imitação sem brilho. Ao mascarar representações, aproximamo-nos do lúdico e, em silêncio, competimos, embora a farsa se repita até à resignação. No regresso a casa, arrumamos em silêncio a impostura que mostramos ao olhar do outro. A diversidade de perspetivas, longe de libertar, transforma-se em fardo, num eu despedaçado, exposto num mostruário de aceitação.
Nem sempre nos levámos a sério. Presos às nossas exigentes
imitações, tornámo-nos caricaturas de nós mesmos. O burlesco embala a nossa
dignidade, preparando-nos para a pose na fotografia. E não há problema, porque
a imagem social converte-se numa dissimulação tão sedutora que todos fingem
acreditar nela. O eu público encontra-se sempre numa pantomina coletiva, ou
seja, cada um representa, todos se elogiam, ninguém se embaraça. O outro
olha-nos com espanto, e nós devolvemos o papel com um sorriso bem ensaiado.
O ridículo, pouco a pouco, assim se fez uma segunda pele.
Sem percebermos, tornámo-nos máscaras burlescas, sem pudor e sem decoro. A
caricatura é já o retrato oficial da sociedade. Ninguém foge ao espelho, apenas
se esconde da vergonha. O eu social não pensa, limita-se a exibir-se, afetado e
presunçoso. Rir dos outros dá prazer, mas esquecemo-nos de que nos
representamos, também, sempre de mal a pior.
A conclusão é simples: a vergonha morreu, e só resta o
espetáculo. A caricatura é hoje o retrato fiel de uma comunidade que corrompeu
a própria vergonha. Vivemos de máscaras porque tememos a nudez do olhar, pois o
ridículo deixou de ser exceção, tornou-se identidade. Assim sendo, a sociedade
do grotesco rodopia entre máscaras e espelhos fantasiando essa outra segunda pele do Eu. A ilusão cumpre, então, a sua habilidosa função de proteger o nosso desespero do vazio neste ridículo modo de vida.
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