terça-feira, agosto 19, 2025

ENTRE MÁSCARAS E ESPELHOS

As nossas imagens sociais deslizam facilmente para a caricatura, numa obstinada tentativa de imitação sem brilho. Ao mascarar representações, aproximamo-nos do lúdico e, em silêncio, competimos, embora a farsa se repita até à resignação. No regresso a casa, arrumamos em silêncio a impostura que mostramos ao olhar do outro. A diversidade de perspetivas, longe de libertar, transforma-se em fardo, num eu despedaçado, exposto num mostruário de aceitação.

Nem sempre nos levámos a sério. Presos às nossas exigentes imitações, tornámo-nos caricaturas de nós mesmos. O burlesco embala a nossa dignidade, preparando-nos para a pose na fotografia. E não há problema, porque a imagem social converte-se numa dissimulação tão sedutora que todos fingem acreditar nela. O eu público encontra-se sempre numa pantomina coletiva, ou seja, cada um representa, todos se elogiam, ninguém se embaraça. O outro olha-nos com espanto, e nós devolvemos o papel com um sorriso bem ensaiado.

O ridículo, pouco a pouco, assim se fez uma segunda pele. Sem percebermos, tornámo-nos máscaras burlescas, sem pudor e sem decoro. A caricatura é já o retrato oficial da sociedade. Ninguém foge ao espelho, apenas se esconde da vergonha. O eu social não pensa, limita-se a exibir-se, afetado e presunçoso. Rir dos outros dá prazer, mas esquecemo-nos de que nos representamos, também, sempre de mal a pior.

A conclusão é simples: a vergonha morreu, e só resta o espetáculo. A caricatura é hoje o retrato fiel de uma comunidade que corrompeu a própria vergonha. Vivemos de máscaras porque tememos a nudez do olhar, pois o ridículo deixou de ser exceção, tornou-se identidade. Assim sendo, a sociedade do grotesco rodopia entre máscaras e espelhos fantasiando essa outra segunda pele do Eu. A ilusão cumpre, então, a sua habilidosa função de proteger o nosso desespero do vazio neste ridículo modo de vida.

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