A atual crise apenas se junta a outras normalmente caladas. A diferença essencial está nas vozes inabituais que se acrescentam aos protestos. A dualização social no seu movimento perverso apenas desordena as fronteiras da geografia das desigualdades e das exclusões. As redes de solidariedade debilitam-se a cada dia que passa ao mesmo tempo que se vão estrangulando as sociabilidades e as convivialidades. À acerbidade do triunfo do individualismo associa-se a pretensa bondade das desregulações sociais e a estas, alia-se a sentença das militâncias que as contestam. Aos territórios tradicionais das classes alarga-se os guetos das gentes perigosas - feitos de gente rica, de criminosos farsantes e de pobres sobreviventes - que avolumam a realidade das inseguranças e dos medos que angustiam.
A atual crise, afinal de contas, não é tanto atual como se supõe. As crises do emprego, das relações sociais e de sentido são factos há muito anunciados mas que apenas alguns tinham dado por isso e agido em conformidade. Ou seja, por aqueles que estão atentos às iniquidades e às desigualdades e as denunciam e, sobretudo, pelos que vivem seriamente injustiçados e desapossados. Hoje, o sonho virou pesadelo e alguns mais vão despertando. O mundo prometido dobrou sociedade irracional e manipuladora. Os mundos imaginários de refúgio, está visto, não são solução. Mas, evitem-se a invenção de utopias que aceitam delongas. O tempo não admite esperas. Um forte sentido mobilizador de oposição sólida às perversidades a que nos conduziram estes tratantes é o lugar da utopia necessária. E a ação urgente um critério da sua vontade …
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