segunda-feira, junho 13, 2011

OS PRINCÍPIOS CONTRAFEITOS DE UM BEM COMUM TRAÍDO

 

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Riccardo Petrella, que tive o prazer de conhecer pessoalmente, num pequeno livro que tem mais de uma década, “O Bem Comum – Elogio da Solidariedade”, refere que a solidariedade deixou de inspirar os princípios fundadores e as normas de funcionamento das sociedades ditas desenvolvidas. Quais são, então, os princípios que o cientista político e social explicita como contrafeitos? Três, no essencial:

1º PRINCÍPIO - Nada tem “valor” se não houver contrapartida, ou seja, tenha valor económico. Assim, só possui valor de utilização os bens e os serviços comercializáveis concordantes com os interesses da economia capitalista de mercado. Eis a bandeira através da qual se procura fundamentar e sustentar os postulados exaltados da liberalização, da desregulação e da privatização, em desfavor da “necessária” extinção dos bens e dos serviços públicos.

2º PRINCÍPIO - A empresa privada é melhor que a empresa pública porque é uma organização estável para conseguir organizar as relações “comerciáveis” entre os membros de uma comunidade humana e entre os países. Nesta perspectiva, logicamente se convoca a tese segunda a qual o investimento privado é o motor do desenvolvimento de qualquer país e, consequentemente do seu desenvolvimento social, desde que não se inclua aqui o que não rende; os militares e as polícias, por exemplo, têm por função, neste quadro, isso sim, contribuir para a competitividade das empresas. Tudo o resto, é injustificável na linha de que o investimento público cria mais prejuízos do que proveitos. Reduza-se, com o tal apelo ao sentido de responsabilidade, as despesas públicas “não comercializáveis” e, em concordância, os impostos sobre o grande capital, as grandes fortunas e os grandes lucros.

3º PRINCÍPIO - Como corolário natural, a ideia de que o capital financeiro seria a principal fonte de criação de riqueza, insinuando a permuta desta do trabalho humano para o capital financeiro privado e, assim, inspirando a revogação de um sistema de valores desenvolvido e que, historicamente, ocorreu no último século.

 

Desta viciação de princípios, Riccardo Petrella diz resultarem duas consequências políticas e socioeconómicas que explicam, a inevitável necessidade do desmantelamento do Estado do “Welfare” por parte das classes dirigentes:

- O trabalho foi reduzido à categoria de custo para o capital, com a consequente e natural redução do seu custo através do abaixamento real dos salários ou da substituição do trabalho pelas novas tecnologias ou, ainda, pela deslocação das empresas para países de baixos salários e de fraca protecção social;

- O Estado ao tributar impostos com finalidades redistributivas passou a ser visto como prejudicial e, deste modo, naturalmente acusado de ser penalizante para a liberdade e a acção do capital. Ao colocarem-se, assim, os Estados em concorrência fiscal entre eles, através da contracção fiscal, favoreceu-se (e favorece-se) o propósito fulcral de destruição do Estado do “Welfare” como convém ao capital.

É nesta ordem de ideias, e noutras igualmente equivalentes, que o pensamento ético confronta a política, a economia e, até, a própria ciência contemporânea, de mau grado para muitos comentadores que hoje se passeiam, sem castigo, pelas nossas televisões ou escrevinham nos nossos jornais, sem que se interroguem se pode haver uma política legítima ou uma economia solidária que não se paute por uma normatividade tendente à realização da Ideia de Dignidade – meta incontornável de uma Ética Solidária para o nosso tempo.

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