A vergonha anuncia-se nos temores da desonra, nas incertezas do ridículo, na apercepção do comportamento inconveniente, na sensação da perda da dignidade, na consciência da humilhação ou na convicção do aviltamento. Na pluralidade de interpretações, uma qualquer nota da pobreza refreada inspira (assim) a prova da significação que cuide do sentido que a vergonha cala.
O que reprime afinal o encobrimento da vergonha? O que tem em mente aquele que faz do fingimento necessidade? Que racionalidade íntima funda essa escolha que à experiência sofrida junta a sequidão do isolamento? O que nos clama aquele (fingido) silêncio impassível na sua forte presença e viva coexistência? Que acessibilidades descobrimos para nos escoltar e levar à crível compreensão desse grito que mima suplicando calado?
Tematizar a vergonha que na pobreza radica, torna-se (no desenho destas interrogações) uma sondagem muito singular e delicada mas irremediavelmente condenada à inquietação da imperfeição do que é inconcluso. A obscureza da sua razão (no entanto, fundante e orientadora) coloca, como condição ao seu entendimento, o conhecimento das totalidades e das circunstâncias em que o humano se inscreve e nas quais ele se determina.
Assim sendo, a razão que aqui se submete ao entendimento não decorre do domínio da lógica mas sim (e sobretudo) do contexto vivencial no qual ela – essa razão – se plasma e alcança sentido. A dignidade, sendo um valor que a linguagem (por insuficiência) não permite esclarecer em absoluto, traz consigo uma pessoalidade que a devolve irredutível aos seus exercícios de compreensão. A pobreza não é, no essencial, o que se vê e está próximo. Está em outro lugar, alguns bem distantes, naturalmente escondido na transcendência do indizível que a cada um pertence.
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