sábado, setembro 20, 2014

CONTRABANDO OU APENAS GENTE DE MÁ NOTA?

Notas falsificadasCom suposto espavento, lê-se hoje nos jornais algo que em nada me faz pasmar. Não examinei o agourento relatório, não desenleei (como é óbvio) os dados proporcionados, apenas me acareei com os supostos – embora indecorosos – sintomas prefaciados. Advertem estes que se inflacionam as notas e se aumentam as retenções tudo em nome da busca divulgada (não necessariamente real) do “valor”, da “verdade” e da “qualidade” das organizações. Por mim, questiono-me, isso sim, como é possível tal sobressalto numa sociedade que, com entusiasmo untuoso, simboliza o rico[1] e que, com igual nitidez e nexo, se deixa enfastiar com a faina de sindicar as receitas de que esse rico se serve para, sem pudor, mais enricar? Pergunto-me, também, como é aceitável tal alarme mediático numa cultura que se inebria, com arrebatada saloiice, com toda a espécie de rankings, onde o digno não se diferencia do merdoso e (sobretudo) ignora, talvez deliberadamente e com uma assombrosa tranquilidade moral e intelectual, as mais que duvidosas, parciais e suspeitas fórmulas utilizadas na legitimação dos seus inconfessáveis pressupostos? Se a classe média se tem vindo socialmente a eclipsar, por que razão não acontecerá o mesmo a esse análogo estrato escolar. Em nome da excelência educativa proponho que a fatídica fronteira do 10 se mova, de uma vez por todas, para o excelso 16. Desentulhava-se a vida das (e nas) escolas e transparentava-se o contrabandismo que o sistema de ranking escolar cauciona, ratificando-se (sem artifícios sombrios) o campo escalar da batota ideológica, política e institucional.


[1] Entenda-se, sobretudo, por rico a jactância do capital social, aquele que se entretém a jogar no tabuleiro execrável da “destruição criativa”, no sentido que Frédéric Lordon lhe confere (LE MONDE DIPLOMATIQUE, de Setembro de 2014).

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