Acabo de ler o texto de Rita Matias, “Como o wokismo colonizou o discurso político”, em “WOKE FIZEMOS?”. Tomando algumas notas, permito-me - com um olhar crítico - fazer algumas observações.
Ponto 1 – Trata-se de uma abordagem que procura reduzir a
complexidade a uma caricatura. Não distingue entre diferentes correntes
progressistas, nem reconhece a diversidade interna do chamado “movimento woke”.
O que procura é fantasiar um inimigo abstrato, equivalente e ubíquo, ou seja,
arquitetar uma estratégia retórica típica do combate cultural.
Ponto 2 – Matias alega que o wokismo colonizou a palavra
política, inviabilizando o debate livre. Ignora, ou tenta silenciar, as causas
e justificações históricas que deram origem às lutas contra o racismo
estrutural, a desigualdade de género, a exclusão colonial e pós-colonial. Trata
essas perturbações como uma doença, escamoteando a problemática das causas
profundas das desigualdades.
Ponto 3 – O wokismo, para a autora, não passa de uma
inversão dos valores civilizacionais ocidentais. O “antirracismo” e o
“feminismo interseccional” são, para ela, não lutas por justiça, mas
ferramentas de opressão ideológica. Trata-se de uma estratégia que procura
camuflar relações de poder efetivas, criando a fantasia de que os privilegiados,
de hoje ou de outro tempo, estariam agora a ser discriminados. Daí a
reivindicação silenciosa do estatuto de vítima por parte dos setores
conservadores da sociedade.
Ponto 4 – Matias queixa-se de casos de intolerância por parte de certos setores ativistas. Porém, não problematiza a tensão entre liberdade de expressão e discurso de ódio, nem reconhece que essa liberdade sempre foi situada por preceitos culturais, jurídicos e éticos. O que Matias silencia pode, com frequência, ser lido como resistência a formas de dominação simbólica.
Ponto 5 – O seu texto não apresenta qualquer autocrítica da
parte da direita. A crítica ao “excesso woke” só é credível quando acompanhada
de uma posição reflexiva, que reconheça tanto os excessos do presente como as
violências do passado (e do presente) que continuam a justificar as lutas
emancipatórias. O texto de Matias é claramente tendencioso, sem cambiantes,
procurando apenas mobilizar distraídos contra um inimigo cultural fabricado.
Conclusão – Sendo eu um homem de esquerda, vejo neste seu texto uma narrativa clara de manipulação retórica, que visa fazer equivaler a crítica social a um antagonismo moralista e reativo. A crítica ao “wokismo” poderia ser feita de forma honesta e construtiva, mas Matias optou por uma visão simplificadora, tristemente emocional e ideologicamente polarizante.
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