Este texto, que sinteticamente apresento, inscreve-se numa orientação teórica que rasga com a separação tradicional entre a razão, a emoção e a ética numa breve exposição, reanimando a ideia de que não há maneira de falar sem afeto, nem afeto sem fala. Longe de ser um mero utensílio de comunicação racional de ideias, o fraseado é apresentado como uma prática social e histórica que abraça sentidos, sujeitos e afetos e, portanto, logo intervém, e de modo enérgico, na concertação das subjetividades e das paixões sociais.
Neste tempo de irrefutável dominação capitalista, este modo
de encarar torna-se particularmente relevante, dado que revela que os afetos
são convocados, encaminhados e até mesmo provocados de modo dedutivo, em
concertação com interesses dominantes. A linguagem não apenas conduz ideologias,
forjando concordâncias emocionais, ajustando sensibilidades e fantasiando
imaginários afetivos que sustentam, ou não, a conveniência social vigente. Isso
representa que os discursos dominantes não apenas convencem, mas afetam através
de densos vínculos que adotam a mercantilização da vida, o consumo como forma
de identidade e a obediência tola à ideia arrogante de produtividade.
As comunidades discursivas, portanto, não se estruturam apenas pelo que dizem, mas pelo que fazem sentir, pelo modo como seus membros compartilham emoções e se reconhecem mutuamente nos afetos que os discursos convocam. Isso explica como determinadas representações (publicitárias, políticas e/ou mediáticas) conseguem aprisionar o desejo e moldar as paixões coletivas, assim conduzidas em direção à valorização do consumo e à despolitização da vida cotidiana.
Este exemplo discursivo procura tirar a máscara à suposta
neutralidade dos discursos, recolhendo em si a sua dimensão ideológica e
afetiva. Ao reconhecer que os sentimentos também são construídos e manipulados
por práticas discursivas, abre-se um espaço para uma crítica mais profunda aos
modos como o capitalismo instrumentaliza a linguagem para reproduzir seus
interesses econômicos, moldando não apenas o que pensamos, mas também o que
sentimos e desejamos. Não importa só o que dizem, tem importância saber como
nos fazem sentir nesta encruzilhada de afetos, ideologia e oratória. Eis o
incómodo do meu estímulo, pois por aqui passa a liberdade e a dignidade humana.
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