quarta-feira, março 26, 2025

A LIBERDADE DE SER DIFERENTE

Ontem vi e ouvi Patti Smith (RTP2), a “poetisa do rock”, apresentar uma síntese do seu espírito rebelde, da sua sensibilidade artística e do seu pensamento espiritual. O seu estilo admirável é uma mistura de temas como identidade, liberdade e espiritualidade, na sua busca por um sentido que ressoe com a sua própria existência. Pessoalmente, e dando importância ao valor da diferença e da diversidade, rejeito a intolerância das normas sociais rígidas e, por isso, senti uma profunda simpatia e afeição por Patti. A ideia de normalidade torna-se, para mim, imoral quando se transforma em uma forma de opressão cultural. Diria, então, que a verdadeira liberdade está em abraçar a diferença e desafiar as expectativas da sociedade, afastando o conceito de normalidade, que muitas vezes serve para marginalizar uns e privilegiar poucos.

Pode-se perguntar, então, em que aspetos sustento a minha opinião e atitude? Começo por destacar o valor que dou à verdade, rejeitando as conveniências que mudam conforme a situação e, em contraste, defendendo a virtuosa emocionalidade humana. Sinto, com clareza, que a verdadeira liberdade só pode ser alcançada, às vezes, através da desobediência às normas e da rutura com as estruturas cínicas e habituais de poder. Aprecio Patti quando sua filosofia de vida reflete essa busca constante por autenticidade, liberdade e uma compreensão mais profunda da experiência humana. Além disso, vejo a sua arte como uma expressão de vida, uma busca incessante pela verdade, pela beleza e pela transcendência moral, ou seja, não pelo bem ou pelo dever, mas pela superação de si mesma. 

terça-feira, março 25, 2025

JOSÉ RODRIGUES DOS SANTOS, UMA ENCICLOPÉDIA DA VAIDADE

José Rodrigues dos Santos é um desvairado vaidoso e, não poucas vezes, converte-se num alucinado "cretinoide". Ao ouvi-lo jactancioso, o que já é enfadonho, num instante arrisco desembuchar algumas palavras genuínas e sem estrangeirismos. Reconheço, o que não será mau, que ele tem uma cabeça bem atulhada, profundamente mergulhada e diplomada nesses laboriosos mitos das culturas afamadas por engravatados paroquianos de impacto significativo. Admito, pois então, que JRS tenha sido um aluno de 20, que bem soube assimilar o esqueleto protocolar e daqui inalar as enternecedoras aspirações, devaneios e exaltações da dita "ocidentalidade" cultural. Para conhecer este sublime homem não será muito fatigante. Sabemos que os sonhos, os lapsos de linguagem e os sintomas psíquicos a todos nós acontecem. Ele, o ilustre e arrogante JRS, é que talvez não acolha nem consiga admitir. Que chateza…

domingo, março 23, 2025

ARTE DE ERRAR COM ESTILO

A vida é sempre uma estrada, e quem diz que o fracasso é um desaire claramente nunca teve a alegria de seguir um caminho errado. Não desistir, e aí nem todos sabem, é a chave para o acerto, ou, pelo menos, para não sermos considerados preguiçosos. E se, por acaso, tropeçarmos naquilo que chamamos de fiasco, não é um desastre; é só a oportunidade de explorar umas paisagens que os vencedores nem sonham que existem. Afinal, se eu tenho alguma razão, pergunto: quem precisará de destino quando temos tantas rotas possíveis?

REDES SOCIAIS, A POLÍTICA DA IDENTIDADE E A POLARIZAÇÃO NO SÉCULO XXI

O conceito de “Armadilha Identitária”, abordado por Yascha Mounk, como já anteriormente referi, é central na análise da dinâmica política contemporânea, especialmente no que se refere à cultura digital. O autor argumenta que a forma como as redes sociais e plataformas digitais orientam as interações, as expressões e até mesmo a construção de argumentos políticos tem gerado um impacto profundo nas identidades políticas. Em sua visão, a cultura digital se configura como um terreno fértil para a ampliação e radicalização da política identitária, especialmente através de ações e reações que perpetuam as divisões sociais.

Mounk observa que as plataformas digitais oferecem espaços onde os indivíduos são constantemente desafiados a se posicionar com base em identidades determinadas por categorias sociais específicas. Este ambiente, por um lado, proporciona visibilidade a grupos marginalizados e fortalece o poder de vozes que antes estavam à margem do debate público. Por outro lado, essas mesmas plataformas fomentam a multiplicação de bolhas de filtro culturais e ideológicas, onde a comunicação se restringe a círculos de concordância, intensificando o apoio à desagregação social.

sábado, março 22, 2025

VOZES E SILÊNCIOS CRIATIVOS

Há vozes e vozes. As que vêm de fora e as que ressoam com a humanidade dos sentimentos. As vozes internas, ao contrário do que se supõe, nem sempre ajudam. A inquietação naturalmente incita a impertinência da culpabilidade, atraindo consigo medos que rodopiam entre a insegurança e o insucesso. Entre as críticas internas e as expectativas externas, o reconhecimento busca o seu destino numa dispersão confusa da busca pela verdade.

Assim, como podemos aprender a distinguir essas vozes que se despegam? Como decidir, nesse momento, qual o caminho seguir? O que procuramos? Medrar ou mascarar? Não é fácil, pois não é simples diferenciar a divergência entre as vozes que importam e as falas destrutivas que se opõem à liberdade criadora.

A autenticidade, ao deixar de lado o medo do arbítrio e das críticas internas, entrega-se ao processo criativo de forma mais livre, autêntica e verdadeira, sem o peso de contingências externas ou da busca pela perfeição. A criatividade não deve ser vista como algo validado apenas por críticas externas ou internas. Ao contrário, ela deve ser um espaço de exploração, onde a insegurança e o medo são deixados de lado para permitir que a criação se amarre ao seu verdadeiro eu, obedecendo às suas ideias mais autênticas.

Em resumo, diria que uma ideia realmente criativa precisa de aprender a silenciar as vozes internas e externas que a limitam, dando espaço à convicção criativa e à liberdade.


sexta-feira, março 21, 2025

O MARASMO TORNA-SE DOENÇA

A mesmice não é apenas arrastar-se por monotonias repetitivas e assépticas. É, principalmente, esquivar-se da possibilidade de imaginar, inventar e criar. Essa apatia íntima, ao se arrastar, leva-nos a uma aparência sem verdade, a um simulacro de rotinas e de artifícios cegamente acessíveis. O pensamento e a ação, ao depreciar a inovação, circulam pelos rumos tediosos e perversos de um certo trabalho e de uma vida sempre recordada. Falar de rotas criativas exige-nos um outro estado de espírito, capaz de enfrentar esse sombrio marasmo. Ou seja, é preciso ousar pensar e agir de forma diferente e decidida, livre de preceitos já enfraquecidos. Estar atento ao novo, ao circunstancial e ao impensado, acreditando na possível criatividade de renovados horizontes, abertos a diferentes possibilidades do homem criativo, é fundamental. Dar valor e sentido à criatividade implica um porvir florescido nessa essencial mudança de perspectiva e no seu constante questionamento do que já tenha sido dado e em remanso desgastado. Como alguém diria, não raras vezes, a ciência alcança a arte. Não raras vezes, a arte alcança o espiritual. 

quinta-feira, março 20, 2025

O QUE SERÁ ISSO DA “ARMADILHA IDENTITÁRIA”?

Tudo o que envolve o ser humano, de alguma forma, magnetiza-me. Os valores que me acompanham, por sua vez, alimentam esse severo "íman" que me impõe um cuidado exigente na forma como concebo a noção de identidade. Por isso, a minha constante e atenta reflexão crítica acompanha-me na dureza e prudência do seu minucioso caminhar.

Este tema, então, leva-me ao que se tem apelidado de política identitária, especialmente ao reconhecer categorias como raça, género e etnia. Servindo-me da ideia de Yascha Mounk, que argumenta que a política identitária se tem transformado numa força divisível, é lógico concluir que, ao acentuar a cisão, estaremos a comprometer a possibilidade de construir uma sociedade mais inclusiva e plural.

No contexto atual, especialmente num tempo fortemente marcado pelo digital, as identidades específicas proliferam, e a sociedade exibe-se cada vez mais fragmentada. A dinâmica do “nós contra eles” nada protege os laços democráticos. Mounk, de forma acertada, alerta que essa tendência pode arruinar a coesão social e, ao mesmo tempo, enfraquecer valores mais abrangentes, como a justiça, a igualdade e a liberdade.

Em síntese, subscrevo a ideia de Mounk, quando ele questiona, criticando a política identitária moderna e suas consequências, se ela é, de fato, a melhor forma de alcançar uma sociedade mais justa e unida. Pergunto-me: como podemos resgatar a coesão social e as qualidades de um espaço público comum?

segunda-feira, março 17, 2025

A VERDADE EM NÓS, EIS UM BICHO DE SETE CABEÇAS

A verdade fundamental não é em nós, de forma alguma, aquela que docilizamos para convencer os outros. Na realidade, trata-se daquela verdade que, ao se alimentar das nossas fragilidades humanas, se torna uma ideia convenientemente adaptada à nossa visão do mundo — uma ideia de verdade que, quando mal interpretada, acaba por ser uma defesa ridícula de como gostaríamos que as coisas fossem, mas não como realmente são.

Quando nos inclinamos sobre o inconsciente, como se fosse uma cápsula do tempo, vemos que a verdade não é nada objetiva ou imutável. Ela é, no entanto, excessivamente subjetiva e ajustada ao molde pelos nossos emaranhados internos, desejos sufocados e traumas não resolvidos. A tal "verdade fundamental", segundo os entendidos, é aquela que vem das profundezas do inconsciente — um lugar remoto e desconfortável de nós mesmos, que se recusa a ser alcançado facilmente pela nossa consciência, mas que, com grande insistência, orienta nossa visão do mundo e de nós mesmos.

domingo, março 16, 2025

EU SEREI O MELHOR PRESIDENTE QUE DEUS CRIOU

… assim nos brindou Donald Trump.

Donald Trump tem sido um mestre na arte de transformar a política num espetáculo de incerteza e imprevisibilidade. Sua habilidade em desmantelar convenções diplomáticas e políticas estabelecidas é quase artística. Ele vai desafiando as regras à medida que encontra conveniência, guiado por seus instintos populistas e cínicos. A diplomacia, que antes se via como uma troca de favores entre potências, agora é apenas um jogo – um jogo onde as cartas são jogadas ao sabor de seus caprichos e interesses pessoais, criando sustos e uma constante sensação de apreensão.

Nos Estados Unidos, a política interna torna-se um campo de batalha onde a imigração é atacada, as relações comerciais são perturbadas, e até o clima parece estar sendo 'importunado'. Tradicionalmente uma fortaleza de previsibilidade, a política externa americana hoje se transforma num caldeirão de incertezas. Os acordos estabelecidos pela NATO, por exemplo, são desfeitos com uma facilidade espantosa, e as alianças se tornam peças de um tabuleiro que Trump move sem hesitar. A diplomacia se torna algo líquido, sem forma, onde as ‘amizades’ se reconsideram à velocidade da sua conveniência.

terça-feira, março 11, 2025

LIBERTAR A LIBERDADE - É OBRA

A liberdade é sempre encarada como um valor fundamental, mas a sua compreensão profunda e a maneira como a exercitamos no cotidiano são questões confusas. Dada a nossa tendência de agir apressada e desatentamente, amiúde ignoramos a forma como nossas escolhas – que consideramos livres – são amoldadas por condições externas, nem sempre entendidas, que limitam o nosso verdadeiro exercício da liberdade. Assim sendo, não deixa de ser essencial refletir sobre essas limitações e procurar compreender de forma mais crítica o conceito de liberdade no contexto democrático, onde as condições culturais e políticas desempenham um papel crucial.

Hoje em dia, a liberdade está frequentemente reduzida a um conceito que privilegia a escolha individual, recusando o contexto histórico e as intenções ideológicas que permeiam nossas decisões. A busca pela liberdade no campo político invariavelmente se mistura com a escolha entre diferentes opções superficiais, como se essas opções fossem realmente livres. Na nossa sociedade e tempo, os campos políticos tornaram-se cada vez mais corrompidos por oratórias que se valem diretamente pelas emoções, zanga ou aflição, em desfavor de um pensamento político mais pensante, crítico e significativo. A coerência emotiva e imediatista acaba então por substituir um debate mais racional, logo mais exigente, baseado no exame das estruturas de poder que realmente conformam as nossas vidas.

domingo, março 09, 2025

O MEU ATREVIDO RETRATO DE SLAVOJ ZIZEK

Zizek é um filósofo singular, cujas ideias ousadas, que mesclam psicanálise e filosofia, frequentemente provocam perplexidade e desafiam convenções. Ele não se limita a um campo específico, mas arquiteta um pensamento multifacetado, norteado por uma inquietação insistente com a cultura presente. A sua dialética, exposta na obra “Sexo e o Absoluto Falhado”, é um recurso poderoso que evidencia contradições no interior da própria cultura, afrontando as normas estabelecidas.

Zizek assim propõe que, em vez de buscar a harmonia ou a conciliação, devemos reconhecer as contradições do tempo. A sua dialética, exposta na obra Sexo e o Absoluto Falhado, desmistifica a busca pela perfeição, propondo que a falha é, na verdade, um motor essencial para a transformação social e cultural.

A psicanálise freudiana, por sua vez, desempenha um papel central no pensamento de Zizek. Ele aplica conceitos psicanalíticos para explicar o comportamento coletivo e os processos culturais. A noção de "inconsciente social" é uma das suas ferramentas mais provocadoras. Zizek sugere que a cultura em si mesma é um reflexo das nossas tensões inconscientes, das pulsões reprimidas e dos desejos não realizados, moldando assim as nossas escolhas e comportamentos.

quinta-feira, março 06, 2025

A FILOSOFIA COMO CAMINHO PARA UMA DIGNIDADE DA CULTURA POLÍTICA

Neste tempo em que a perturbação emocional é muitas vezes aproveitada para alimentar raciocínios desalinhados e complexos, torna-se essencial recolocar a emoção no seu campo certo, como uma força de transformação e entendimento. A motivação central do autor, aqui, é justamente inquietar o modo de vida de cada indivíduo, incentivando uma nova afinidade com o que há de mais profundo e genuíno na nossa humanidade. Somos seres de alma e coração, e é por meio do desejo — aquele impulso que nos lança na busca incessante por conhecimento, pela invenção e pela descoberta — que nos relaciona com o mundo. A Filosofia, entendida não apenas como um estudo teórico, mas como um modo de vida, convida-nos a refletir sobre como nossas emoções e pensamentos moldam nossa realidade e nossas escolhas.

O afeto, em sua forma mais pura, tem o poder de nos aproximar do outro, das coisas e de novas ideias. Do silêncio, muitas vezes, surgem novas visões, e é nas relações e na empatia que as convicções e projetos comuns tomam forma. A filosofia como prática não é uma reflexão distante, mas um movimento constante que altera nossa forma de viver e agir no mundo. Se, por um lado, ela nos ensina a refletir sobre nossas emoções, por outro, faz-nos perceber como as nossas ações são a verdadeira expressão de nossa filosofia pessoal. O comportamento humano, muitas vezes negligenciado ou obscurecido pelos interesses externos, é o espelho de nossas crenças mais profundas.

quarta-feira, março 05, 2025

A IMBECIL VAIDADE

A vaidade, com seu perfume de má qualidade, torna-se um dos modelos mais caricatos da boçalidade humana. Não no sentido de uma ausência total de inteligência, mas na inabilidade de percebermos além da superfície petulante do retrato fugidio com que o nosso espelho nos endromina. Somos vulneráveis criaturas de vaidade, amamentadas pelo rastreio infindável da incessante validação, como se o valor procurado fosse atestado pelos olhos alheios, por essa cínica simpatia de uma convivência incerta e efémera.

A vaidade é, porventura, o molde mais leve de tolice que o ser humano não só cultiva, mas também nela resvala. Ela, essa vaidade, sugere-nos que o que somos pode ser veiculado através de indícios de relevância, em corpos cinzelados ou em aparências bem retocadas. Somos vaidosos, talvez até ridículos, acreditando que, ao procurar sermos nós mesmos, somos, na verdade, eternos mascarados, descurando a verdade de que nada do que é superficial perdura. A vaidade é um delírio que nos vicia e afasta da essência do ser, fazendo-nos crer que a exterioridade é, afinal, e de mau fado, tudo o que somos.

REGRESSAR À INTRIGA DO ABSURDO

O absurdo é uma força que nos arrasta para o imediato, onde os sentimentos momentâneos tomam o lugar da razão, e o despropósito substitui o sentido. Num mundo onde o ilógico se disfarça de esclarecimento, perdemos a capacidade de questionar e refletir. O que parece importante agora rapidamente se torna irrelevante, enquanto o essencial é esquecido. O valor dos caminhos percorridos se esvai, e o que era útil, um dia, torna-se obsoleto e sem futuro.

O absurdo corrói a nossa humanidade, ao fazer-nos olhar apenas para o que está ao alcance do imediato. A escala humana perde o todo e concentra-se na ação individual, como se o universo começasse e terminasse no nosso “umbigo”. Criamos uma conveniente teia de justificações que se sustentam na sobrevivência e no efémero, na busca incessante pelo agora, enquanto a verdadeira profundidade da experiência humana se dissolve.

Viver no absurdo é viver como se estivéssemos sempre à margem de nós mesmos, presos num ciclo de inquietação, onde, apesar de tudo, mantemos nossa integridade apenas pela aparência, e não pela sua humana e viva essência. 

terça-feira, março 04, 2025

O ABSURDO EM CENA

A vida humana é, e sempre foi, um palco onde o desatino se apresenta, ora como razão, ora como irracionalidade. Em busca de equilíbrios, a razão tenta alinhar-se com a realidade, mas, simultaneamente, a vida não abandona o vício, a insensatez e o insuportável sofrimento. Este conflito entre razão e instinto resulta numa inquietação constante que, em vez de oferecer a clareza, nos mergulha na incerteza e no desconforto.

A irracionalidade, presente no nosso comportamento, torna-se uma exaltação do que não conseguimos compreender. Desvincula-se da lógica e nos arrasta para uma experiência de vida que parece ausentar-se de qualquer entendimento racional. Em muitas ocasiões, a razão, enquanto faculdade intelectual e qualidade mental, perde-se nas pluralidades da existência humana. Na essência da nossa consciência, a lucidez parece perder-se, como se o que somos fosse algo além da compreensão racional.

domingo, março 02, 2025

RACISMO INSTITUCIONALIZADO E SUAS ESTRUTURAS DE OPRESSÃO

O racismo institucionalizado é um conceito que descreve as formas sistemáticas de discriminação que estão integradas nas instituições e estruturas sociais de uma sociedade. Esse tipo de racismo vai além de atitudes individuais; ele é embutido nas políticas, práticas e normas que regulam o funcionamento das instituições, resultando em desvantagens para determinados grupos, particularmente para pessoas não brancas. A supremacia branca, como uma ideologia central, é sustentada por uma visão do mundo em que os padrões culturais, estéticos e comportamentais associados aos brancos são considerados a norma. A partir disso, tudo o que é diferente dessa norma é classificado como inferior, criando um ciclo de exclusão e marginalização que se perpetua através de gerações.

Essa estrutura de opressão não se limita a indivíduos ou grupos, mas infiltra-se em todos os níveis de poder, desde as políticas educacionais e de saúde até o sistema judicial. A forma como a sociedade se organiza e distribui recursos reflete as desigualdades impostas por esse racismo, tornando difícil para as vítimas de discriminação institucionalizada romperem com o ciclo de desigualdade.

O PODER SISTÉMICO E O FUTURO DAS DEMOCRACIAS

Nos dias atuais, os sistemas de poder que afetam a totalidade de uma sociedade têm se tornado cada vez mais difíceis de alcançar democraticamente. Estes poderes sistémicos, muitas vezes invisíveis à perceção da maioria, escapam ao controle das instituições políticas e sociais, colocando em risco a eficácia da democracia. A grande questão que se impõe é que a verdadeira riqueza não está apenas na clareza intelectual ou na educação, mas nas dinâmicas de poder que a riqueza propicia.

As fortunas, por si mesmas, não conferem poder. No entanto, é o poder que a fortuna proporciona que torna essas fortunas um elemento central no jogo político e social. O dinheiro, nesse sentido, não é apenas um recurso econômico, mas um veículo de influência que fragiliza os Estados. Em vez de se submeterem aos limites impostos pela soberania nacional e pelos princípios democráticos, essas grandes fortunas criam suas próprias regras, muitas vezes se opondo abertamente aos Estados e suas políticas públicas.

SOBRE A "GUERRA E PAZ"

De Manuel Loff, em https://www.odiario.info/guerra-e-paz/

Eis uma crítica contundente, mas interessante, ao discurso belicista e ao crescente apelo ao armamento. A crítica central de Manuel Loff reside na forma como a guerra e o armamento são apresentados como inevitáveis, e como a segurança é frequentemente usada como justificação para políticas autoritárias e repressivas.

Manuel Loff alega que a "securitização", enquanto processo de tratar questões políticas, sociais e econômicas como questões de segurança, é, na verdade, uma estratégia para reforçar regimes autoritários. O insistente discurso militarista, que se alimenta do medo de inimigos externos e internos, propaga uma visão de mundo que justifica a violação de direitos individuais e sociais em nome da segurança, levando a um enfraquecimento da democracia e da justiça social. A crítica vai além da simples corrida armamentista, apontando que essas políticas reforçam uma cultura de vigilância, disciplina e obediência, sem espaço para contestação.

sábado, março 01, 2025

A LIBERDADE, ENTRE O COMUM E O DESCONHECIDO

A liberdade tem o seu tempo, um tempo forçosamente histórico. Depende não de uma transcendência, de um “em si”, mas certamente de uma subjetividade que é sempre consequência de uma cultura, de um tempo. De um bem e de um mal, ou de outras convicções que igualmente conformam a comunidade de sentimentos e as suas faculdades de discernir. O bem torna-se assim o comum dos homens, um comum que se converte em norma, em esquemas que, de forma coerente, vinculam múltiplas e contíguas retóricas. O sentido ético faz-me, neste contexto, companhia, mas não me esclarece as saídas, nem, em tempo algum, me aconselha. A vida torna-se, quem sabe, uma arte de viver, fazendo do homem livre um aguerrido que não esmorece. Parafraseando livremente Deleuze, enfatizo a ideia de que nunca nada é realmente conhecido; muito do que é reconhecido é arrasado, tudo isso em favor de um engenho do desconhecido. 

segunda-feira, fevereiro 17, 2025

TECNOLOGIA, SUBJETIVIDADE E OS DESAFIOS ÉTICOS NA ERA DA INOVAÇÃO

Quando reflito sobre as mudanças que a invenção e a mecanização trazem, não apenas para o campo técnico, mas também para a própria subjetividade humana, sinto-me um pouco perdido entre esse avanço e as transformações nas mentalidades e formas de viver. A invenção não se limita apenas ao progresso do saber técnico; ela provoca também mudanças nos desejos e objetivos das pessoas. Daí a grande dificuldade, apesar das inspirações significativas que surgem. As repercussões dessas transformações abrem novos horizontes e modos diferentes de organização social. A padronização tecnológica, que organiza a sociedade moderna, não se resume apenas à sua evolução, mas representa uma mudança desafiadora e provocante nos modos de ser e de pensar.

A transformação tecnológica não se limita a uma soma de inovações, mas traz também novas formas de organizar a vida, que, por sua vez, impactam as múltiplas subjetividades humanas. Ou seja, afeta as diversas realidades que se inter-relacionam no trabalho, no tempo e até mesmo no âmbito das emoções e perceções do mundo. Surge, então, uma questão fundamental: a relação entre a subjetividade humana e os valores éticos em tempos de inovações tecnológicas poderosas. A subjetividade é moldada por uma combinação de fatores culturais, históricos e sociais, e impulsionada pela experiência individual de cada pessoa. As inovações, especialmente as tecnológicas, têm um impacto direto e imediato sobre essa ordem subjetiva, alterando a forma como nos vemos, nos relacionamos e percebemos o mundo ao nosso redor.

domingo, fevereiro 09, 2025

ESCUTAS E RUÍDOS NA DURA C0NVERSA HUMANA

A cultura contemporânea tende a valorizar excessivamente o prazer imediato, dando destaque ao êxtase momentâneo. Esse prazer, muitas vezes, é vivido de maneira fugaz e sem uma reflexão mais profunda, sendo consumido de forma passiva e acompanhando as circunstâncias distraídas que nos cercam. Nesse cenário, a emoção predominante é uma animação impetuosa, que cria uma fantasia de agitação superficial. A ideia de desordem, vivacidade e tumulto acaba obscurecendo questões fundamentais, como a saúde, o bem-estar coletivo e as dificuldades cotidianas. O foco no prazer efêmero desvia a atenção do compromisso mútuo e das relações profundas, favorecendo respostas desumanas que se espalham pela sociedade atual, marcada pela incerteza.

Diante disso, é urgente prestarmos mais atenção aos sons dispersos e aos ruídos que permeiam nosso pensamento. A escuta atenta de ideias, neste contexto, se aproxima da escuta psicanalítica. Devemos, assim, cuidar de nós mesmos, igualmente.


domingo, janeiro 19, 2025

O TRAMPISMO POR LÁ SE INSPIROU

… numa "sutil" divagação pelos recantos de Martim Moniz e arredores.

Nos últimos dias, quando a gripe se instalou e a minha paciência, já por si entorpecida, decidiu tirar umas férias, resolvi enfrentar os percalços com uma calma de dar inveja. No meio desse delicioso torpor, decidi espiar, ler e tentar decifrar a comédia política que se desenrola por aí. E, claro, como sempre, não me decepcionei. É fascinante observar como, entre o vaivém das palavras, das alegorias e das representações políticas, se cultiva essa farsa imensa e, claro, lucrativa.

Logo de cara, percebe-se, sem muito esforço, as diferenças gritantes no modo como se tenta acicatar e inflamar, sem rodeios, as almas sensíveis que por aí andam. Para que, então, se faz necessário elaborar e orquestrar essas encenações tão cuidadosamente arquitetadas, que seduzem com promessas de causas justas e revolucionárias, tudo isso regado a doses cavalares de indignação e ressentimento? Um espetáculo e tanto. E, ah, que pressa! O tempo não pode ser desperdiçado com raciocínios mais demorados e que desafiem a lógica. O que se quer, na verdade, é agir rápido, sem grandes questionamentos, porque a obra em questão não tem paciência para sutilezas. O que conta é o fervor político, esse que não se arrisca a abandonar o seu jargão de pânico, que materializa, em toda a sua glória, a irracionalidade da crença que o sustenta. 

Como não sou dessas, nem me vou deixar levar por esse embalo, deixo aqui a minha crítica despretensiosa — e, quem sabe, até um pouco irónica. E, sim, assombra-me a capacidade de quem se atreve a construir uma lógica do absurdo e a seguir, com dedicação e fervor, os arrazoados ideológicos que, se não fossem tão trágicos, poderiam ser um bom tema para uma peça de teatro do grotesco.


domingo, dezembro 29, 2024

AFIRMA-SE O PODER, MASCARAM-SE OS PILARES

A afirmativa do primeiro, do Poder, concentra-se no cerne da lei, ou mais nitidamente, no modal campo da governança. Os outros, os ditos pilares, por sua vez, permanecem, como se sabe, mais ou menos silenciosos no operante cenário aditivo e em constante evolução. O primeiro catequiza a doutrina e controla a autoridade. Espreita a todo o momento o infrator, castiga o abuso e achaca sempre em voz alta o acusável indiscreto. Os outros sempre subordinativos, seja por cálculo ou ingenuidade, operam nas franjas dos consequentes corpos sociais. Mesmo estando no topo, apesar do seu comando, demonstram incapacidade de se desobrigar da sua responsabilidade. A ideologia, quanto a isto, mais que do que ideias e valores fixa-se nas práticas úteis e reguladoras da diferença e da subordinação. A palavra, por sua vez, procura nesta onda nem sempre alcançável, a sua inverdade aventando ameaças, fantasiando constrangimentos e alucinando vergonhas. A arena da civilidade, então, e em tal caso, derrama o seu sangue para fora dos seus próprios limites, confundindo sentidos, gerando anomias e reprimindo a convivência responsável. O chamado “mundo comum”, o pronunciado mundo humano, assim se vai perdendo neste emaranhado excessivo do ferramental técnico e competitivo da cultura contemporânea, onde o conflito se torna cada vez mais presente, vulgarizado e, pior, celebrado em sua reputação distorcida. É dentro dessa teia de ilusões, armadilhas e preconceitos que busco vislumbrar a verdadeira bondade das bandeiras que me cercam, aquelas que alardeiam, sedutoras, as ambições de liberdade e democracia. 


quinta-feira, dezembro 05, 2024

SABER LER APRENDENDO A CONVERSAR COM O QUE SE LÊ

 

O QUE É QUE ESTOU AQUI A FAZER? - livro recente de João Francisco Gomes em conversa com Ricardo Araújo Pereira – começo a lê-lo. Ainda no prefácio SOMOS UMA PERGUNTA, de José Tolentino Mendonça, e logo aí, faço questão de salientar algo afirmado pelo humorista e que o prefaciador acompanha na citação seguinte.

À inteligência e à honestidade de Ricardo Araújo Pereira é devido mais. Como ele diz de si: “leitura e interpretação de texto é uma coisa absolutamente central na minha vida”. O exercício de ler e interpretar dá-nos a todos uma consciência da vastidão da pergunta que somos e da incompletude do que conseguimos. Por isso, pode-se dizer que as nossas conversas são mais interrompidas que acabadas. Oxalá este livro seja um ponto de partida para muitas conversas.

Sinceramente gostei do excerto, e tanto gostei que o tornei a ler e a reler. Saber ler e ter firmeza em interpretar implica, na verdade, fazer parte do texto, imaginando familiaridades e afinidades ao sentimento e ao pensamento que o acompanha. No íntimo, significa dar sentido à vida das palavras e dessa vida espírito à alma humana da pessoa que as lê. Pacientemente, mas em tempo algum, não com as certezas que a reprimem e sufocam. A saudável conversa por aqui passa. Escutando e dialogando com o que se lê.

segunda-feira, novembro 25, 2024

OS DEBANDADOS DE ABRIL

Festeje-se à vontade e livremente o 25 de novembro. O 25 de Abril jamais se sentirá diminuído. Todavia, os que neste dia de 74 fugiram, ou se esconderam, naturalmente ainda não se livraram de velhos hábitos. A diferença compreende-se. Sempre ausentes e fugidios querem hoje, e apenas, a condição de democratas para melhor oxidar a democracia. Daí se ergue a capciosa esperteza acentuada por impulsiva altivez de uma voz sempre abrilhantada pela belicosa insolência da palavra. Assim sendo, como é óbvio, o 25 de novembro dos esmadrigados jamais poderá ser visto de outra maneira que não contra, ou seja, obstinadamente em combate com a salutar e fiável premissa do 25 de ABRIL SEMPRE.

sábado, novembro 16, 2024

VIVER SUSCITA SER, SER QUEM SABE DE MODO DIFERENTE

 Habita-se hoje, no interior do seu pardo e atrativo rebuliço, uma arrevesada e ilusória globalização. Como se sabe, uma realidade prensada na ondulação sublime da padronização do nosso sobreviver. Entregues, e em acrescento julgo certo, a uma empática agitação do alagado enxurro tecnológico. Mais, descuidadamente em sintonia assaz ajustada à silenciosa e proficiente cofragem capitalista. A humana frieza alcança por aqui, pelas suas revolucionárias vias interconectadas, inauditos enleios. Viabilizando, sem instantes de alívio, pelas suas buliçosas e diluviosas vias atrativas. A cultura da virtualidade assim se reverte ubiquidade encadeada por sortidas diversidades mesmo que obscuras. Eis o bornal onde, e convenientemente, se ensacam as forragens da embriagada inverdade que se escora neste meândrico mundo sempre amodernado. O que é rápido, e rapidamente passa, logo que consumido, deslinda o sinal litúrgico do calculável descarte. De imediato, resta a palavra, a palavra da perfeição que sonha um recomeço, desperta o espírito da mudança e estimula a alma da esperança. A técnica busca fatalmente a apressada solução, a arte da clareza futura o mundo em que o humano possa existir e reencontrar-se com si mesmo. A razão humana vai por aqui hesitando atufada na desordem das vicissitudes que a espicaçam. A ânsia de a revigorar esmiúça rumos, interpela valores e alonga esperanças. Os tempos de hoje não dispensa o equilíbrio da razão, certamente. Não obstante algo mais exige, a elevação do pensamento que se obriga à empatia da expressão ética de fidelidade ao humano.

terça-feira, outubro 08, 2024

O DESPERTAR LENTO DO COMPROMISSO COM A VERDADE

Academicamente a filosofia poucas vezes comigo se cruzou nos caminhos edificantes da escola. Eis uma insuficiência, algum tempo atrás por mim sentida como uma expressiva carência na arte de dialogar com a vida. Trancado em estipuladas noções teóricas e no seu cómodo repouso generalizado nem sempre povoei, experienciei, o sentido real do existir. Pensei comodamente em uma integridade humana facilmente acobertada no decifrável horizonte das incorporadas abstrações. Nos últimos anos, e com o tempo e empenho para tal, encontro-me voltar atrás, e com otimismo e atrevimento, reinventando rumos e deslocamentos das minhas gastas e destoantes arrumações sugeridas pelo sono da inércia. A filosofia reconhecida como modo de vida acumulou em mim não só uma presença, mas igualmente um estímulo ao alento performativo, uma inspiração associada a essa força ética que se identifica com esse incontornável compromisso com a infinda verdade. Como? Pouco ou nada sei. Ainda assim, reconheci a urgência de me libertar do ignorante medo que me venceu, assim como me atrevi a alumbrar a obscuridade que, no tempo ido, o entendimento me turvou. Com o tempo fui, igualmente, distanciando-me desse erro acomodado e idiota feito arma da protocolar embustice e, como não podia deixar de ser, agregadas às superstições dos múltiplos poderes desses mágicos, esses multifacetados artistas das crendices irracionais. Não chegarei lá onde quero, estou certo. Todavia, vou caminhando espairecendo outros ares assumindo o admitir a filosofia como um objeto histórico entre outros.

terça-feira, outubro 01, 2024

UMA DIATRIBE, QUIÇÁ DE UM EU ENFADADO

Faço acionar o apresto televisivo, sobretudo para testemunhar o mais do mesmo e dessa reiteração a energia da rendosa obstinação. A tartufice assim se vai mantendo alquimiando predicados e orquestrando restauradas balelas. Sobretudo, revolteando zangas, e assim catando, para seu proveito, o extensivo e débil interior humano no abalo do seu sensível. A arrogância, também sempre presente, nada falha à custa de aforismos de curto enunciado, consumadas como máximas de penetráveis e vantajosos sentidos. A ansiada e desejada terra molhada, e necessariamente pastosa, facilmente se vai fazendo chão sujo. Dir-se-ia, com pachorra e paciência, é a vida. No entanto, uma vida que pelo interior da resignação se emporcalhará e o sujo faz-se lama que se exibe dando molde ao seu imundo mundo. Através do obsceno arbítrio, do direito oculto e distante que, na sua taciturnidade, saberá exaurir o amargurado vazio desse comum, entretanto por inteiro descabido.

domingo, setembro 22, 2024

E SE REDEFINIRMOS AS PEDRAS NO TABULEIRO DA VIDA?

O intento deste “gritoeargumento” que aqui vou despontando sempre procurará achegar-se à expressão livre de pensar e sentir procurando objetar a ardileza das insistentes e enlaçadas ideias desfocadas. Ou seja, aquelas asfixiadas pela domesticação, pelas rotinas ou pelas gaiolas dos trivializados que sempre enfraquecem e impacientam a qualidade do olhar humano. O pensamento foi, é, e sempre será, uma viga basilar e construtiva da vida. Todavia, reconhecendo que tal não é, nem nunca será em absoluto, a alma da sua vivacidade e entusiasmo. O amor próprio, a dignidade e a humana reciprocidade não podem estar ausentes pois, com o tempo, o desejo de viver bem, a caminho da paz consigo e com os outros, aqueles pilares não podem ser tornados secundários. Tudo o que obstinadamente persiste parece-me existir num mundo cinzento, num mundo matizado por cínicas abstrações que, de soslaio propósito, encaram o ser humano de esguelha não enxergando, no arranjo montado, as suas duras e reais inquietações da humana condição.

quinta-feira, setembro 19, 2024

FONTES DE RUMORES, PELOS VISTOS, DEMOCRÁTICOS

Os rumores tornam-se com facilidade intermédios. Através deles, animam-se popularidades e excitam-se as limitadas espertezas. Sem-vergonha, os manhosos propósitos com facilidade se entregam a corriqueiros agasalhos de engendrados e fantasiosos roteiros. O mundo da internet, agradecido ou não à sua reinação, ajuda-o na atrevidaça ousadia. Basta entregar-se às sombras da viralidade, dos seus artificiosos cultores e, como não podia deixar de ser, à passionalidade desassossegada dos perdidos. Todos eles irmanados ao gene egocêntrico da mimética patologia que tanto agiliza como arrebata. Certamente mantenha-se tranquilo. Tudo isso se torna tolerante em nome da liberdade da indignação em fúria. Para tal não é exigido coragem nem vindicado princípios. Basta um acomodado e proficiente desplante do burlesco talento para os desprezar. 

quinta-feira, setembro 12, 2024

NÂO, NÃO SE EXIBA ASSIM

Não se ria do outro com espertezas fáceis e esfalfadas. Não se faça de lambisgoia tentando manipular com palavras melosas e falsas. Muito menos repelindo um outro qualquer com um dissimulado e reles enjoo arquitetado. Não definhe mais a sua humana e já desazada inteligência. A sua saloia esperteza, plena de manha e segredo, não vai levar você a lugar algum. Pare e aprenda a contextualizar: observe, ouça e reflita. A sua solidária inclinação para a razão trará recompensas. Deixe de hesitar. Liberte-se da dúvida e das suas dificuldades não resolvidas.


O COXEAR DIALÉTICO

A pronta e pacata abstração, por vezes e não poucas, serve de regaço à nossa sornice ou lerdeza em falar ou mesmo em pensar. Mas o senso não nos falta e não nos mente. O que é preciso é termos ousadia e palpite, prevendo contentar os descuidados ouvidos que nos atentam. Não obstante, o contínuo coxear afadiga e enfada a impaciência das gentes. Evidentemente. Logo, mudemos de assunto.

quarta-feira, agosto 28, 2024

CHEGA DE PARALAXES

Tudo serve, e o que serve, faz-se ingrediente da verbosa, embora frutífera, tagarelice política. A multiplicidade de relativíssimas glosas assim se exibem, mais do que mundanas, grosseironas. Seguramente angariando do devaneio linguareiro um eficaz alvoroço capaz de golpear e insuflar o povo zangado, enfuriando os tormentos ressabidos. O poder pelo poder não tem fronteiras na busca de uma deslavada ontologia que a possa apresentar e, sobretudo, representar. Se possível abiscoitando a obediência e arrastando a vassalagem tornando-a viva na fidalga submissão. Como é reconhecido, em prol dos desfavorecidos, quiçá dos distraídos enrolados nesta adulterada cena de sujos equívocos. 

domingo, julho 28, 2024

A MELODIA SILENCIOSA DO INQUIETANTE DEVIR

O ideal do bem humano não deixa de viver com o homem na sua progressiva e enleada mundanidade. O dia-a-dia das possibilidades, dos entusiasmos e das deceções fazem sempre parte empírica dessa inevitável utopia. Uma vida incessante e incansável em que se interroga e busca o modo ético desse desígnio humano. Sem fim, de ousada e arriscada ambição na procura desse caminhar incerto, embora estimulante, afrontando a busca fundada na humana verdade. Seja dentro de nós, seja nos outros que nos acompanham e que connosco se relacionam. Apurando a crescente e confinante trivialidade onde a verdade nos escapa e a razão ética se enfraquece na imediatez contínua e persistente da desatenção. Isto posto, porventura resgatando a inevitável busca de si tornando a desvalida vida num permanente confronto com o ansiado fundo de si próprio. Ou melhor, no interior dessa constrangedora e íntima liberdade, que José Régio acautela através do seu encosto ao refúgio “não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou por aí”.

domingo, julho 14, 2024

A MÁSCARA E SUAS SOMBRAS

Encontrar-se frente a frente com a verdade será certamente de uma repetida e humana certeza. Abraçando-a exige-se alcance, liberdade e determinação. Por vezes, talvez muitas vezes, ajustando-se ao intranquilo embaraço do incómodo estímulo. Trata-se de um ato enredado, porventura desvirtuado na fuga apressada da desperta simulação. Forçado à sombra da mentira, pressentindo que o uso da máscara a resguarde. Todavia, como diria Oscar Wilde, se dizer a verdade pode ser uma coisa dolorosa, ser forçado a mentir é sempre muito pior. Apesar do sorriso nos lábios, o rumo do humano assim se desassossega perdido nos inquietos tempos dos seus rotineiros transvios. A verdade humana não é por certo fácil, mas a sua falta desperta uma desmedida fraqueza. Esse incontentável abraço que enlaça o seu alcance, harmoniza a sua liberdade e alicerça a sua determinação. 

domingo, junho 30, 2024

ATURDIDO NOS ARSENAIS DA RAZÃO

Recuso, contraponho e sem tranquilidade precipito o pensamento. O meu interior assim se constrange deslizando-se na repetição descuidada do assimilado e sombrio uso do rotineiro. Reinventar-me não é fácil. Para além da indolência, a razão que a acompanha oferece-lhe uma certeza que me alicia e acostuma. O mundo assim se me faz mais pequeno e o meu humano nele se entorpece cerrado na sua falsa e mórbida diversidade. Como posso, então, ressignificar esta névoa e enganosa forma de pensar? Não será fácil, mas possível. Já me pus a caminho…

quarta-feira, junho 19, 2024

NADA SEI, MAS ESTRANHO

Repisando um conhecido rifão, aproximando o seu foco à vida dos dias de hoje, diria que cada um de nós teve passado, tem presente e, enquanto nada acontecer, terá futuro. Onde poderá estar, então, o imbróglio do tempo? Encontrar-se-á seguramente no factual da vida e nas suas vacilantes órbitas. Passado foi e é passado e o presente dele se afasta a caminho do futuro. Como? Desenredando rumos de confuso enxergo, hoje de duvidosas “metas volantes”. Assim sendo, as ditas cartas do “passado, presente e futuro” se enleiam no baralhar dos destinos e não na abstração do tempo. Parafraseando e concordando com Arthur Schopenhauer diria que o destino baralha as cartas e a nós resta-nos jogar. Será assim tão simples e cómodo?

sábado, junho 15, 2024

O BELO

Quando o olhar me encanta, as palavras calam-se dentro mim. Desde logo o imaginário se me manifesta de forma livre, expandindo-se sem pressa. O íntimo surge e aqui vagueia ainda que silencioso. Um outro modo de sentir desponta e se transforma em um olhar singular, que se solta e me reavive. Sem razões primeiras ou prescientes. É um sentimento que, por si só, me faz devanear pelos sonhos que idealizo, e aos quais, abertamente, me entrego. Seguro de uma distinção que me inquieta marcada pela livre palavra e pelo enigma que a envolve. Valorizar o diálogo silencioso torna-se, então, uma escolha de estar, de ver e de reconhecer a beleza do Belo. A inspiração proteger-me-á, aflorando-se sempre viva. Devaneando a cada instante nesse céu azul da arte viva do silêncio. Uma arte de viver, de viver no segredo do seu silêncio.


domingo, junho 09, 2024

O ZIGUEZAGUE DO COGITAR

Com displicência e comodidade, observa-se o mundo através de conformidades apressadas e, muitas vezes, superficiais. Obediências alimentadas por arrimos ilusórios e cômodos, que parecem representar um alicerce seguro. A preguiça patológica compromete o olhar atento, e assim se forma um pensamento desatento que conforta. O devaneio lógico se harmoniza, e o momento contínuo reforça-se ao ser refletido no espelho. A emoção irracional ganha espaço, e o desconforto treinado se encarrega de moldar uma convicção conveniente. Submetido a si mesmo, pensa-se para si próprio, buscando livrar-se da embaraçosa incerteza. No entanto, o ruído da tolice começa a se fazer ouvir, disfarçado no íntimo da palavra narcísica. E, por fim, impaciente, e por vezes, de uma forma deveras descabida.


AMANHÃ VOTE-SE NA DEMOCRACIA

Amanhã é dia de votar. Sei que não está apenas em jogo a escolha entre os partidos proponentes, mas também o compromisso com a democracia enquanto princípio. Isso envolve, sem dúvida, o campo social e político, mas vai além disso. A democracia se carregará de novos significados, e, com ou sem eles, ampliará sua projeção e relevância humana. A cidadania democrática também estará em jogo, e embora não se esgote amanhã, será a partir desse dia que sua dinâmica se renovará. Torço para que, amanhã, a democracia prevaleça, aproximando seu valor simbólico da realidade desafiadora dos nossos tempos.

quinta-feira, junho 06, 2024

DA CENSURA AO ACINTOSO VAZIO MORAL

A humanidade constrói seu destino por meio das suas mediações mais íntimas e profundas. Ao longo de muitos anos e intensos sentimentos, dois preceitos têm me convencido e esculpidos em mim: a harmonia do reconhecimento da simplicidade como valor humano e a nobreza que a beleza, em sua qualidade, alcança e revela. Por isso, a desilusão se torna cada vez mais penetrante em mim, acompanhada de um juízo lamentavelmente cético. Os tempos, hoje sem tempo, pouco ou nada ajudam. Embora, em arenas de sentidos contrastantes e enviesados, o Ter e o Não Ter se esgotem na circunstância dos seus distintos momentos.

Assim, não consigo crer no sentido da palavra leal que dignifica o ser humano, especialmente diante desta polarização perversa do Ter desigual. Ao longo de uma ardilosa e dominante doutrina encoberta por véus, traçam-se, social e geometricamente, assimetrias. Daí, o acinte da indignidade e o consequente vazio moral.

sábado, maio 25, 2024

LIBERDADE DE EXPRESSÃO, SIM, A DIGNIDADE É UMA MERDA

No TEATRO AR, apresentam-se burlescos espaços cénicos. As linguagens artísticas se entrelaçam, fundindo emoção e palavra corriqueira. As farsas prosaicas, terra a terra, bailam em cena. Fantoches não faltam, a comédia se desenrola e o teatro de rua se exibe. Através de cantigas de desamor, escárnio e maldizer, constrói-se a teatralidade da pregação política. Nada parece triste ou mal-amanhado; tudo é grotesco, truncado, e merece atenção. Eis as matrioscas cômicas oferecidas no TEATRO AR. Piadas, chalaças e sujeira parecem cativar o fado. Mas que expressão de merda é esta? E as minhas palavras, quiçá, não sejam diferentes.

domingo, maio 12, 2024

A SOMBRIA MIMESE DO SUJEITO SEM SUBJETIVIDADE

(ou o empobrecimento da interioridade face à redução da cultura a mercadoria)

Evolui-se nos tempos, nos contínuos e factuais atalhos e seus imaginários porvires. Sempre pronto a livrar-se de entrelaçadas dispersões que se atravessam nas saídas que se buscam. Cuidando de si certamente. Todavia, não evitando aquele OUTRO que, através de si próprio e da sua zelosa palavra se esmorece. Mais direi que desaparece nas falsas e acomodadas circunstâncias do útil apego à empírica razão da ilusória certeza. No entanto, a inquietação da vida revela-se, aconselha e ousa ensinar que é sempre tempo de deixar de se enganar a si próprio. Talvez vivendo sem medos feitos de fraquezas e inquietações, abandonando-se em suposições irremovíveis de um ser incerto e desprevenido. Mais claramente, deixando de ser SUJEITO ao admitir a vassalagem do valor ético da sua liberdade e, por consequência, tolerando o empobrecimento humano do seu ser ou, mais conclusivo ainda, da sua estéril e incontornável subjetividade.

domingo, maio 05, 2024

UM PANO DE FUNDO ENCURVADO

Ao reler Charles Taylor, relembrei as três fontes de preocupação por ele referidas; o individualismo egocêntrico, a principalidade da razão instrumental e a alienação da esfera política. Por que não lembrar, então, os tempos que vivemos e o acerto deste suporte de três pernas que cenicamente se concerta? Em especial, nesta indefinida agitação da liberdade mergulhada na desorientação e fragmentação de um exíguo mundanismo individualista? Ser-se livre dá muito que pensar! O aparente aconchego atolado nesta ociosa displicência jamais satisfará o humano e amparará a modernidade dos tempos vindouros.


quarta-feira, maio 01, 2024

PORTO DE PINTO DA COSTA

O meu amigo XICO MADUREIRA, assim o recebo, simpaticamente me mimoseou com este inesperado poema relembrando alguém que muitas vezes nos acompanhou nas alegrias, nas passeatas e em diversas e misturadas conversas. O PINTO DA COSTA assim o merece e não deixou de ser merecedor. O nosso reconhecimento e respeito é tudo quanto lhe podemos expressar. O presente não muda o passado, todavia importa que o futuro respeite o passado e mude, se possível, o presente para melhor. Obrigado PINTO DA COSTA.


Almiro,

Envio-te estas décimas

Com um abraço

 

 

                  Mote

Porto de Pinto da Costa,

Minha cidade de encanto,

Serás sempre a minha aposta,

O amor que eu aqui canto!

                 1

Vemos o rio a passar,

Vindo das serras vizinhas,

Tudo são ternuras minhas

A querer com ele ir ao mar...

Ele é este meu amar,

Tanto que a minha alma gosta,

Tudo aquilo que se mostra

E nós queremos repetir,

E é o meu persistir,

Porto de Pinto da Costa!

                2

Há muitas outras cidades

Com as suas subtilezas,

São muitas velas acesas

Nas suas muitas verdades...

Mas sempre terei saudades

E ternura, tanto, tanto,

Tudo aquilo que levanto

Dentro do meu coração,

Tu és a minha paixão,

Minha cidade de encanto!

                3

De braço dado comigo,

Cada um dos moradores,

Esses tão queridos cantores,

Em cada um, um amigo!

E assim eu vou contigo,

A subir a nossa encosta,

Na causa que me é proposta

Por ti, cidade que és querida

Tu és a mais bem vivida,

Serás sempre a minha aposta!

                  4

E é a vida tão breve,

A passar no nosso peito

Nós com a morte sempre a jeito,

Ah! que a vida se conserve!

O meu estar a ti se atreve

Peço amparo ao meu quebranto,

Tu não és decerto um santo

Mas não me deixes sozinho,

És tanto do meu carinho,

O Amor que eu aqui canto!

 

Um abraço do

Francisco 

segunda-feira, abril 29, 2024

UM HOMEM, QUIÇÁ, CHEIO DE SI

O Senhor Presidente é um homem deveras empático que sabe avizinhar-se emocionalmente do outro, relaxar a comicidade do seu ânimo e aplicar-se com facilidade à contingência do incerto. No entanto, não sei se me refiro apenas a peculiares e atraentes qualidades ou a uma otimização de habilidades nelas sincronizadas e, sobretudo, delas emancipadas. O tempo e as multifacetadas peripécias não me levam a invalidar as primeiras, mas talvez a aceitar a egolatria virtuosa das segundas. O último episódio, mais do que testemunhar esta certeza, interroga-me sobre o que efetivamente deprimiu o Senhor Presidente para lhe provocar tamanha fúria narcisista. Quem sabe, então, descortinar o rastro dos respetivos e prováveis significantes de tão exímio entusiasmo?

sábado, abril 27, 2024

25 DE ABRIL, HOJE E TODOS OS DIAS

Hoje, como no passado, luta-se pela infinda LIBERDADE. A condição humana da LIBERDADE, essa, jamais renunciará. A LIBERDADE em todo o tempo foi, e será, impulso de ser, do humano que deixa história, de um social horizonte que em tempo algum se esmorecerá. A LIBERDADE far-se-á, como sempre, palmilhando roteiros sempre imperativos, sempre inacabados, na verdade, insubmissos. Entre os tempos de um presente, reconhecidamente imperfeito, e um horizonte de um inevitável porvir idealizado. Caminhando-se solitário, talvez se alcance descansos adormecidos. Brechas de acaso em um todo injustamente gretado. O abraço humano, esse, ordena por si uma condição outra, a cada instante reavivada por uma disputa empenhada e capaz. A LIBERDADE exige, pois, coragem, firmeza e desvelo, continuamente atenta à farsa inércia da indiferença e aos seus vazios acenos de apelos sedutores. A LIBERDADE assim se mostra, não apenas pela palavra, mas pela humana envolvência de uma cidadania inquieta que cuida e exige do assunto político e acastela a lisura ética da democracia. O 25 de Abril, sim, mas hoje e todos os dias.

terça-feira, abril 09, 2024

EU TINHA A SAUDADE À ESPERA, Oh, meu tempo como tu voltaste pra trás, traz-me sim a identidade que eu perdi, tem pena e dá-me a vida, aquela boa vida que eu em família já vivi.

Nota - Apenas recorri à canção de Tony de Matos para saudar o erudito livro, ontem apresentado, que enclausura e concentra a identidade humana no regaço familiar.


domingo, março 31, 2024

O CINISMO SEM DECÊNCIA

A bipolarização política ajusta-se hoje a excêntricas raias partidárias. A pressuposta direita desliza-se para renovadas crenças e a segmentada esquerda refunde-se no decorrente desalinho deste sinuoso tempo dito pós-político. A apoquentação é a que é e a luta ideológica no campo do poder político assim se vai tonificando, ofuscando o litigado referencial democrático. A luta pelo mando torna-se mais agitada e arrogante, as múltiplas crises assaz esgrimidas e as discriminações sociais notoriamente expostas. Nesta mundanidade capitalista, de arenga patológica, tudo se faz para institucionalizar abstrações de hábeis mistificações ideológicas capazes de a inocentarem, tolerarem, logo, de a abraçarem. A exclusão inclusiva alongará certamente o desplante.

sábado, março 23, 2024

O PRESTIGIO DA GRAVATA

No mundanismo da penitência há pedidos de desculpa que atraem. Contudo, há gentalha enfatuada que pela vénia não convence. Trata-se de uma casta cabotina em que, mais do que a verdade, a prosápia é que se achega. A diferença não está certamente no tropeção, mas na insistente entrega à recorrente altivez. Para melhor alcançar o juízo, o primeiro pede desculpa, o outro apenas revela uma dubitável imoderação. Aquele joga de igual para igual, este último desequilibra-se na sua presunção. O referente de um não se combina com o representativo do outro. Um encaminha-se pelo reparo. Espera a desculpa. O entufado, esse, não consegue desvincular-se do seu mérito moral. Ou seja, do poder da gravata e do seu nó no gorgomilo.

SORORIDADE, UMA VOZ DE SILÊNCIOS

Ouvi a palavra sororidade. Achei-me estranho. Confesso que nunca a tinha lido ou escutado sequer. A curiosidade logo se me acentuou na elevação circunstancial do seu uso. O sentimento de solidariedade apercebeu-se em mim intensamente atraído. Pelo seu sentido ético e, em especial, pelo valor da sua fundura humana. Avivando-me, além do mais, empatias idealizadas que me levaram ao lugar de muitos outros semelhantes. Desafiando-me horizontes epistemológicos que sempre me aproximaram e encaminharam para múltiplos interiores e seus diferenciados cenários. A generalidade como figura sempre se impacientou com as diferenças de compreensão do desenvolvimento humano. Ao ponto de até o pobre esconder a vergonha da sua penosa realidade. Afinal, pergunto, que lente usamos para observar estes debates ontológicos? 

domingo, março 03, 2024

A INDIFERENÇA RARAMENTE SERVE, NUNCA A DEMOCRACIA

A atmosfera da disputa política do momento tem vindo a tornar-se um clima favorável à inoculação viral da desinformação. Como? Emaranhando cabíveis discordâncias com intentos que, no seu básico, apenas fomentam a corrupção dos propósitos. A democracia deixa assim de o ser quando se entrega vulnerável ao fado da corrupção. Através da falsidade, da detração sistemática, da má-fé, da violência, das arengas de ódio e de outras viciosas artimanhas. A palavra em si fala por si, todavia é na sua sombra que por inteiro assume a vitalidade da desencaminhada intenção. A democracia, e o democrata, não deve, não pode ser indiferente a esta condenável e grosseira sagacidade. Ou seja, apreciando tais conteúdos inteiramente forjados enquanto sinais distorcidos sem correlação com o essencial e, sobretudo, com a sua verdade. Sabe-se que vivemos um tempo pardo de ordinárias “fake news” que ajuda e possibilita formas de corrupção na sua diversificação e intoxicação de ambientes contagiantes. Neste ponto (e em concreto) quando a corrupção da informação tem, no campo político, uma significação moral de consequências sociais e humanas imperdoáveis. 

quinta-feira, fevereiro 29, 2024

UMA GEOMETRIA DECLINÁVEL

A lei económica, hoje mais do que nunca, não só ordena como se apodera do destino humano. Arrasta lógicas, transfigura idiossincrasias e bem se engorda à custa de outrem. A abastança é a meta, a patranha maestria e o domínio condição. Os vinténs dispersos tiveram o seu tempo e a sua sóbria catequese. O mercadejar hoje não atura a palavra doce dessa reza. Quer certezas inatacáveis, logo bem protegidas. O poder da grana não se expõe, é fáctico. Escondido e silencioso manobra o abuso e assenta o roteiro. O fosso ganha distância e o castelo situacionista protege o bicho.

terça-feira, fevereiro 13, 2024

ESTAREI PREPARADO PARA TUDO?

O engodo na (e da) palavra política serve-se hoje mais da sua ligeireza do que do inegável embuste. A desfaçatez da balela artificiosa medra com os tempos mascarando-a na arte recicladora do retoque. O argumento afugenta-se do concreto, mas o feitiço do carisma, calando a guinada, dá conta do recado exaltando almas. As verdades brigam entre si, umas mais mascaradas, outras sem arte no espalhafato. Para lá chegarem, ao tentado efeito, uns driblam melhor do que outros. Todavia, atrelados em campo, distinto nas cotoveladas. Uns obstinados na sua verdade, outros inflexíveis na sua certeza, outros ainda gaguejando na parada. Verdades diferentes, agilidades reversas, silêncios estrondosos. No pardaço da discordância, a verdade assim se vai perdendo, dispersando-se no imbróglio democrático da chicanada. 

quinta-feira, fevereiro 08, 2024

TEMPOS SEM TEMPO

Tempos de inverdades e empáfias, baloiçantes estas entre a enxurrada livre da conformidade e a mediação implicante do seu reflexivo. Remove-se fronteiras, alterca-se arraias e rivaliza-se ascendências. A impaciência acontece e a subjetividade que pensa perde pujança, talvez ânimo para esgravatar. A aparência alcança então espaço, a sua palavra presença, atabafando a realidade no fosso nublado do sumiço. Entre a aparência e a realidade faz-se assim vaguear a dita liberdade, sim, aquela que não atura o intrometido voto da dignidade ética. 

domingo, fevereiro 04, 2024

CHEGA DE XINGAMENTOS

A democracia valoriza-se relevando a coerência lógica dos seus arrimos basilares. Judiar a liberdade, suportada pela palavra fingida e colérica, insultante e afrontosa, apenas socorre a arte batoteira do eficaz e lucrativo devir político. A democracia não pode deixar de ser essa concreta universalidade cujo denominador comum seja claro e as divergências que a incrementam atualizem o todo nas suas diferentes proposições e eficiências. Pela ação e discordância, com certeza, pela palavra confiável, séria e polida. Não pela danação exibicionista do insulto que a história bem nos recorda e rejeita. Isto é, fazendo deslizar o significado "democrático" pelo avesso da sua dignidade.

sábado, janeiro 20, 2024

A POLÍTICA NOS MEANDROS DA VIGÍLIA E DO SONO

Discorrer sobre o viver político é, por princípio, frequentemente agitado. Todavia, a diligência de se dar pressa à sua razão fá-la mostrar-se no conveniente conforto do seu útil retrato. Pela palavra acertada, com sentido e método, ela se anuncia simulando. Ergue o seu arbítrio e entrega-se ao acerto da palavra reanimando emoções mais do que propósitos. Absorvendo a imaginada desordem move as necessárias e inferidas incumbências. Entrega-se, pois, à utilitária serventia do premente proceder. Recriando ou adulterando a convincente e eficaz generalidade. Aquela que mais facilmente possa arrumar o embaraçoso bulício. É sua, da razão ataviada, o acomodado papel de enlaçar as confinantes abrangências. Ordenando inclinações, acertadas apreensões e ousados juízos. A caminho de induções judiciosas e de recomeçadas ideias mais aguerridas e infalíveis. Aconchegando assim o percetual imediato através do trivial e do suposto possível. Embora grosseira e ardilosa, a repisada razão anuncia-se sempre forte no seu poder de convencer, e vencer, o receio que a incerteza suscita. A esperteza saloia assim sobrevive, e não só, também faz política.

terça-feira, janeiro 09, 2024

MAS, AINDA ASSIM, VOTAREI

A política excita-se nestes dias pela palavra e exacerba-se pela acústica. É um pautado tempo de saracotear a democracia e acotovelar lugares nas correlações de mando. Assim se agitam populares e amoldadas regências na muda e embrulhada excitação de eleger. Todavia, não os desviados, que calados, exigem, fazem acontecer e desse ocorrido se privilegiam. Ou seja, esse outro escondido real que acorre ao silente antro do pilim e do seu poder. Estes não vão a votos, apenas tratam de regras e de normas, de obediência. Logo, a ilusão vai idealizando o que resta, a sua liberdade e o poder de avivar e animar, apenas e tão-só, a aparência do cerimonioso formal. A agiotagem não é, nem nunca se amostrará neste democrático e liberal torneio. Como sabem, a treta não tem espaço nem tempo para politiquices ou outras curtições.

quarta-feira, dezembro 27, 2023

A LETARGIA DA INDIFERENÇA

O tempo acelera, o tempo chispa. Sem tempo para sínteses. Os fundamentalismos assim vão apressando as proveitosas verdades que aldrabam. Exortando esparramados dados que no dizer da mentira logo se unem e se aceitam. Os sofridos, neste ensombrado dos tempos, prontamente enxergam eventuais candeias. A onda digital assim se exibe atazanando o desprevenido. O noticioso igualmente se apressa a copiá-la rivalizando a disputa. Todos eles, uns mais outros menos, ao serviço da trapaceira luz do relativismo. Pior ainda, bem colados à truculenta incumbência de destruir a clareza significante do estímulo democrático.

sábado, dezembro 23, 2023

SAUDADES EM TEMPO DE NATAL

O Natal acontece entregando-se sempre a memórias que dão vida. Uma vida que a cada instante presenteia o Natal que se dá. Lembranças renascidas que se perfazem ainda mais belas e sublimes. O Natal é sempre um tempo singular de imaginação, abalos e sentimentos. A saudade merece assim ser recebida como uma prenda. Vivida como arte íntima de expressar um diálogo consigo mesmo. Sim, uma prenda passível de reinventar a realidade que a ela se acresce. A saudade, em dia de Natal, estará sempre presente no pensamento e na sensibilidade. Saibamos reconhecê-la e tê-la à mesa através das memórias que o tempo em tempo algum anulará. 

terça-feira, dezembro 12, 2023

GRACEJANDO COM A ETIQUETA … TANTÃ

Eis um ritual a todo o momento disponível a preceitos imitativos, procurando copiar. Servindo-se de aparências costumeiras ainda que dúbias. Ao bom gosto de um bizarro rendez-vous, ainda que macaqueando. Importa sim distinguir-se nos muitos espelhos. Neste tempo de sinésicos costumes, para além dos seus. Afinal, das amostras de uma casta que não a sua. Confiante no trepar da acirrada subida à cobiçada encenação. A autonomia desencaminha-se. Sim, mas não faz mal. A autenticidade adaptar-se-á à convencionalidade dos seus diversos maneirismos. O importante é representar, configurar a colocação do eu social, supondo ser mesmo Eu. 

terça-feira, dezembro 05, 2023

À LUZ DO ARTIFÍCIO

Não sei por certo deslindar o que enxergo, bem como o que escuto. Por vezes, tudo se me encena estranho. Ainda assim, procuro ser ágil em modelar as suas finuras representações. Tanto quanto desfraldam as afinidades presumidas que daí irmanam convenientes fachadas. Ajeitando ângulos, e com eles em harmonia, as astuciosas artes daí cinzeladas. Os tempos modernos, absorvidos como vanguardeiros, facilitam a sigilosa sagacidade e proveitosa aceitação. As analogias e as suas referentes vizindades vão capazmente atarracando o acerto dos seus juízos. A reflexividade e a alienação com prontidão aí se enlaçam na espinal medula talhada pelo artificio de viver. Parafraseando Zygmunt Bauman [1], "por decreto das circunstâncias, como que seguindo os esquemas de um kit de montagem". Todavia, um engenho montado pelo próprio usador e em caprichada liberdade.



[1] Em A ARTE DA VIDA. 

sexta-feira, dezembro 01, 2023

UM REPERCUTIDO AMANHECER

Levantei-me preguiçoso. Quem sabe cético. Talvez ainda fechado na minha madornice. A razão e a vontade não se entendem. É cedo demais. Mas vamos a isto, à vida. Pode ser que encontre alguém, a circunstância que me faça esquecer este mundo péssimo e do pessimismo. Basta que me encaminhe divertidamente à humana partilha da razão. Assim sendo, até mais logo…


domingo, novembro 19, 2023

O ÓNUS DA PROVA CABE A QUEM INCULPA

 Nem sempre, mas reiteradamente, sinto-me distante da certeza que me leve à tranquila evidência. Sempre determinado, e ousado, na prática birrenta do virtuoso direito à liberdade de duvidar. Como? Deslocando-me da atingível verdade do circunstancial implícito, revelada pelas circunstâncias, para uma oriunda razoabilidade compreensiva das suas entranhas. Gesto, quiçá, manifestamente pessoal mas sentido como dever de presença e obrigação. À partida, o inspirador cenário intuitivo esclarece rumos de maior relevância na aproximação do argumento ao concreto do real. O argumento não será, pois, uma parcela de um cálculo exato, supostamente evidente, mas sim passos operantes de esclarecedoras sequências interpretativas. Esclarecendo sentidos e conferindo à ordem clareza no entendimento. A razão por vezes perde-se, e não poucas, no uso ingénuo das palavras e das suas articulações. O conceito “DEMOCRACIA” não pode, pois, adormecer na inércia escuridade da sua bandeira.

quinta-feira, novembro 02, 2023

A VERDADE, PENSANDO BEM, VESTE-SE DA MENTIRA

Respiram-se ares de um enojo infeto por ardilosas verdades. O mando arbitrário falseia sinais que lhe são embaraços, os duros poderes conspiram tecendo alheias traquinices e o envilecido criticismo infesta de chinfrins o pastoreio do critério. A liberdade aqui se recreia, pois então, por espelhos diversos e embiocadas máscaras. O peso ágil de uns assim se adianta ao aperto de outros trepando reservadas escadarias. O sprint aperta-se e o abismo faz-se meta, fosso imaginário da obra sinuosa da suja petulância. O controle assim se cuida nas verdades caladas das mentiras que servem. Em apologético democratismo de mercearia.

domingo, outubro 29, 2023

A DESTREZA DE IMAGINAR

Há dias em que sinto felicidade. Outros de acasos menos venturosos. Ademais, muitos até, em que não me procuro. Nestes a razão torna-se incapaz e a imaginação na falta dela de mim se ocupa. Acolho aí, distintamente aí, a dura consciência do sentido do seu caminhar conjunto. A cada instante despertado, mas nem sempre capaz da sua sadia intimidade. Porém, sempre ansiando a circunstância exultante da sua afinidade acertada.